ESPECIAL ESTIAGEM

Com a falta de chuvas, comunidades estão recebendo água através de caminhões pipa na região

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Em Hulha Negra, açudes estão completamente secos Foto: Emater Hulha Negra/Especial TP

As altas temperaturas e a falta de chuvas estão causando sérios problemas para as comunidades da região, principalmente do interior dos municípios. Em algumas localidades, o abastecimento com caminhão pipa está ocorrendo desde o início do verão, porém se agravou nas últimas semanas.

O jornal Tribuna do Pampa tem acompanhado o drama vivido por Prefeituras e moradores. Açudes completamente secos e perdas em lavouras são dois grandes problemas aliados a falta de água potável para consumo humano em algumas localidades.Novamente sem previsão de chuvas para amenizar a situação, um cronograma já foi montado pelos setores de abastecimento das prefeituras para que a água possa chegar nas residências para as necessidades básicas.

PERDAS NO ESTADO – A projeção de safra das principais culturas de verão foi apresentada no dia 3 durante a ExpodiretoCotrijal, em Não-Me-Toque. O levantamento preliminar, segundo informações da Seapdr, feito em todo o Estado durante a segunda quinzena de fevereiro, aponta para perdas decorrentes da estiagem, com maior impacto nas culturas de milho e soja. Os dados da Emater indicam que o Rio Grande do Sul deve colher 28,7 milhões de toneladas nesta safra, com valor bruto da produção na ordem de R$ 32,72 bilhões. “Com expectativa de não termos chuva nos próximos dias, a situação das lavouras pode ser agravada e termos a evolução do status de estiagem para seca”, disse o secretário da Agricultura, Covatti Filho, ao lado do presidente da Emater, Geraldo Sandri, e do diretor técnico, Alencar Rugeri.

A estimativa de safra aponta para perdas mais expressivas no milho grão, com redução de 21,2% na produção e 22,3% na produtividade, com 5.991 kg/hectare. Embora a área plantada tenha crescido 1,5% nesta safra, com 783,3 mil hectares de plantio, a produção esperada é de 4,7 milhões de toneladas – 1,2 milhão de toneladas a menos do que a projeção inicial da safra. Para milho silagem, a produção deve cair 20,7%, com 2,6 milhões de toneladas a menos, em área plantada de 334,8 mil hectares. A produtividade estimada pela Emater tem queda de 19,9%, passando de 37.052 kg/hectare para 29.676 kg/hectare. A amostra se refere a 96,1% da área cultivada, que nesta safra foi reduzida em 1%.

 

Cerca de 300 famílias estão sem água
no interior de Hulha Negra

Animais estão enfrentando problemas para beber água Foto: Divulgação TP

No município, que é abastecido exclusivamente por meio de poços artesianos, a situação se agrava a cada dia que passa sem chuvas. Em entrevista ao TP na quarta-feira (4), o coordenador de águas do interior, Moisés Abreu, mostrou preocupação com o cenário da seca, principalmente no campo. Segundo ele, dos 28 assentamentos e três comunidades do interior do município, somente três ainda não necessitam de abastecimento por meio de caminhão pipa, o que já chega a 300 famílias atendidas. “Diariamente o caminhão está nas estradas levando água para as famílias e este número só aumenta. Constantemente recebo ligações das pessoas solicitando água, mas gostaria de esclarecer que estamos fazendo o possível, utilizando dois caminhões e um trator com tanque para locais mais próximos”, explica.

Frisando mais o momento de preocupação, Abreu também explica que o interior é abastecido com água de dois poços – um da Serra da Hulha e outro da Trigolândia. “Hulha Negra não possui água suficiente para atender a todos da forma necessária. É difícil e até mesmo triste chegar às propriedades e ver as famílias sem água e cuidando cada gota que é colocada na caixa de água. Entendemos, pois cada família está recebendo em torno de 500 litros que devem durar quase 15 dias. Infelizmente é o que estamos conseguindo fazer no momento”, lamenta.

Famílias estão sendo atendidas pela Prefeitura através de caminhão pipa Foto: Divulgação TP

SEDE – A reportagem do TP também contatou com o vice-prefeito Igor Canto, para saber as medidas tomadas de forma imediata e projetos para amenizar o problema de falta de água que assola a área urbana. Isso porque, o município já passa, desde o final de dezembro de 2019, por racionamento de água durante a tarde – das 13h às 17h – podendo levar a períodos longos em locais altos e prédios devido à falta de pressão na rede de abastecimento.

Conforme o gestor, quatro obras estão previstas para melhorar o sistema, sendo uma a construção de uma rede adutora para ligar a caixa de água localizada ao lado da igreja católica, ao bairro Floresta. “Esse é um projeto pela Fundação Nacional de Saúde (Funasa), da época do governo anterior e conseguimos fazer alterações. Estamos aguardando a empresa responsável para iniciar a obra que, quando pronta, vai abastecer o bairro sem que haja necessidade de, diariamente, abastecermos a caixa com caminhão. Também pela mesma empresa, deverá ser trocada a mangueira que leva água até o Santo Antônio, por uma rede, melhorando o abastecimento”, relata o gestor.

Após instalação de redes adutoras, caixa de água próxima a igreja católica deverá abastecer também de forma direta o bairro Floresta e o assentamento Santo Antônio Foto: Silvana Antunes TP

Canto também anunciou a instalação de hidrômetros nas residências para o consumo consciente de água. “A falta de água e o racionamento se agravam pelo uso inconsciente de água – enchimento de piscinas e lavagem de casas e carros constantemente. A empresa contratada vai fazer as instalações e as famílias vão pagar pelo que consumirem. Vai ser necessária a adaptação dos moradores, mas já é algo implantado na maior parte dos municípios”, expõe.

Uma obra esperada há bastante tempo pela comunidade é a construção de uma Estação de Tratamento de Água (ETA) pela UTE Pampa Sul – com capacidade de 20 mil litros de água por hora – na Trigolândia. Junto à estação, serão construídas duas redes adutoras, uma para envio da água da barragem que abastece a usina até a ETA e outra para a sede do município. “A prefeitura já instalou luz e água no canteiro de obras da empresa, agora aguardamos, de fato, o início da obra que, segundo nos foi repassado, não deve demorar para ser concluída”, explicou o gestor.

Por fim, o vice-prefeito falou sobre um poço artesiano localizado no Ceppa e com capacidade de produção de 24 mil litros de água por hora, que também abasteceria Hulha Negra e segundo Canto, não está ocorrendo. “Estamos contatando o governo do Estado para uma solução, inclusive há uma reunião marcada para a próxima semana entre o prefeito Renato Machado e o secretário de Agricultura, Pecuária e Desenvolvimento Rural Covatti Filho, pois beneficiaria em torno de 154 famílias do interior de Hulha Negra”, manifestou Igor, expondo também o objetivo de aluguel de uma escavadeira hidráulica para limpeza de açudes e captação de água da chuva quando ocorrerem precipitações e a compra de tanques com reboques para as associações de moradores dos assentamentos para que eles possam buscar a água e auxiliar o processo de abastecimento.

AGROPECUÁRIA – O TP teve acesso aos laudos de precipitações e estiagem da Emater/Ascar de Hulha Negra, que deverão ser anexados aos documentos da Prefeitura para um futuro decreto de emergência. Segundo o levantamento, em janeiro de 2020 o volume de chuvas foi de 90 mm – 31% abaixo dos 130 mm e em fevereiro, 30 mm – 23,4 % apenas correspondentes aos 128 mm esperados.

O laudo assinado pelo engenheiro agrônomo e chefe do escritório da Emater Guilherme de Pietro Zorzi mostra uma situação mais agravante. Segundo os registros feitos pela Emater, os volumes de chuvas dos últimos 30 anos no mês de fevereiro, somente são menores que os 2020, em 1991, com 22 mm, e 2005, com apenas 11 mm. “Cabe salientar que os registros se referem a zona urbana do município e que as chuvas estão apresentando grande variação nas diferentes localidades do interior, havendo muitos relatos de volumes significativamente mais baixos que os registrados na sede”, frisou.

Falta de chuvas está afetando a produção nas lavouras Foto: Emater Hulha Negra/Especial TP

EFEITOS NAS PRODUÇÕES – As baixas precipitações estão refletindo na produção agropecuária, a qual tem participação fundamental na geração de receitas do município e grande importância social pelo número de famílias que dependem exclusivamente do cultivo de grãos e da produção animal para obtenção do sustento. Os prejuízos já são estimados em R$ 13.730.110,48 milhões.

Confira a situação de cada produção segundo a Emater, tendo em vista a quantidade de produção e as perdas:

– MILHO –1.800 hectares de milho para produção de grãos, 500 hectares para produção de silagem e 900 hectares para produção de sorgo também apresenta prejuízos consolidados. A falta de umidade resulta em problemas na polinização, espigas e panículas de menor tamanho, grãos com peso muito reduzido ou perdidos menor produção, além do secamento das folhas que não podem ser aproveitadas no processo de ensilagem. Prejuízos entre 20% e 40.- SOJA – 15.000 hectares de soja plantados e uma perda estimada em 25%. A falta de chuvas está resultando em plantas com menor desenvolvimento vegetativo, redução no número de nós, menor engalhamento e fechamento irregular de entrelinhas, além de perdas de umidade do solo, aumento de ácaros e tripés.
– BOVINOCULTURA DE LEITE – Principal atividade de 370 famílias. A estiagem está afetando diretamente o desenvolvimento inicial e rebrote das pastagens, reduzindo a oferta de forragem de qualidade na dieta dos animais. Com a escassez de chuvas nota-se rebaixamento considerável dos açudes, inviabilizando o consumo pelo excesso de barro e risco dos animais ficarem atolados. Perdas na ordem de 25% na produção de leite.
– BOVINOCULTURA DE CORTE – Estima-se prejuízos a médio prazo devido a baixa taxa de prenhez das matrizes, menor escore corporal das vacas com cria ao pé e consequentemente baixo peso dos terneiros. Também pode depreciar o valor final pago pelos compradores, levando a uma perda de 20%.
– MEL – As 103 famílias do município com atividade apícola terão redução na produção em torno de 10% considerando-se as 70 toneladas de mel colhidas em anos com clima normal. Devido à falta de chuvas, a intensidade das floradas é comprometida bem como pode ser observado abortamento de flores das plantas e consequentemente a oferta de alimento para as abelhas.
– ARROZ – O potencial produtivo das lavouras é inferior ao estimado devido ao atraso na semeadura ocasionado pelas chuvas excessivas registradas em outubro de 2019 e também pelo registro de vários dias com temperaturas abaixo de 15 graus nos meses de janeiro e fevereiro, coincidindo com o início da fase reprodutiva das lavouras onde ocorrem grandes perdas devido a esterilidade de espiguetas.

Plantas estão com desenvolvimento anormal e secas devido a falta de chuvas Foto: Emater Hulha Negra/Especial TP

Candiota decreta situação de emergência

Comunidades também estão recebendo água Foto: Divulgação TP

A prefeitura de Candiota também decretou situação de emergência no dia 27 de fevereiro devido a baixíssima precipitação pluviométrica ocorrida nos últimos meses de 2019 e durante 2020, acumulado insuficiente para captação e reposição de volume nos açudes.

Além disso não existe previsão de chuva, por no mínimo mais 20 dias, tornando a situação preocupante. De acordo com o prefeito Adriano dos Santos, esse é um procedimento que vem sendo feito por todos os municípios da Zona Sul. O prefeito relata ainda que algumas medidas já estão sendo tomadas como a locação de um caminhão pipa desde dezembro para levar água ao interior do município para o consumo das 130 famílias afetadas pela estiagem. “Até a semana passada o abastecimento intercalava em um dia sim e outro não, mas nesta semana o serviço já foi intensificado e está sendo realizado diariamente. Também solicitamos ao Exército um caminhão e já locamos mais um para esta semana. Mas infelizmente a perda nas lavouras já é muito intensa”, afirmou.

A Secretaria de Agropecuária informou que esta situação está causando sérios danos ao setor agropecuário por insuficiência de água no interior do município, afetando principalmente a atividade leiteira e a produção de sementes e hortaliças.

Açudes estão com pouca ou nenhuma água e em péssimas condições Foto: Divulgação TP

Lavouras já apontam produção com inconformidades e grandes perdas Foto: Divulgação TP

Pinheiro Machado trabalha na abertura de poços

Máquinas estão abrindo poços em busca de água para os animais Foto: Divulgação TP

No município, conforme apurado com o chefe de gabinete da Prefeitura, algumas medidas já estão sendo tomadas para amenizar as consequências da falta de chuvas – principalmente na zona rural. “A Prefeitura de Pinheiro Machado, através da Secretaria de Obras, já está abrindo poços para os animais e também está levando água potável para as famílias do interior que estão enfrentando o desabastecimento”, informou Alex Rodrigues. Até o momento, 30 famílias estão sendo atendidas. Segundo ele, os moradores que necessitam de abertura de poços em suas propriedades devem solicitar uma guia junto à própria Secretaria de Obras. “Diante da grande procura, o cidadão entra em uma fila e assim que possível vai sendo atendido pelo município”. Até a manhã desta quinta-feira (5), o titular da pasta, Danúbio Peres, informou que 121 famílias já solicitaram o serviço junto ao setor responsável. O mesmo procedimento deve ser realizado aos que precisam de água potável.

Desde a publicação do decreto de emergência, realizado no dia 11 de fevereiro, o chefe de gabinete contou que os servidores estão trabalhando em cima de um cronograma para prestar atendimento às famílias.

Ainda sobre o abastecimento, a reportagem também entrou em contato com o diretor da unidade pinheirense da Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan), Jeferson Iribarrem, o Gegê. Ele assumiu o cargo nesta segunda-feira (2). “A Corsan está atenta e monitorando a situação, na última semana dois avisos foram divulgados pelo antigo diretor para que as pessoas fizessem uma utilização mais consciente da água e vamos continuar trabalhando nessa linha. Para nossa surpresa, os dois dias seguintes foram de significativas diminuições no consumo de um modo geral no município – sinal que as pessoas entenderam o recado e também estão preocupadas”, destacou.

De acordo com o novo gestor, a situação é delicada não só em Pinheiro Machado e é importante a colaboração de todos. “Estamos constantemente verificando os níveis da barragem e não está descartado totalmente um racionamento se as chuvas não retornarem em breve para a nossa região”, disse Jeferson.

De acordo com a estação meteorológica localizada em Pinheiro Machado, na Serra dos Veleda, a precipitação acumulada nos últimos 35 dias é de apenas 46 mm.

Abertura de poços visa amenizar a falta de água para a pecuária Foto: Divulgação TP

Pedras Altas pede agilidade ao Estado

Conforme noticiado pelo TP, a Cidade do Castelo decretou situação de emergência no dia 27 de fevereiro, em virtude da forte estiagem que assola o município. A decisão foi tomada em razão dos prejuízos causados na agricultura e pecuária, bem como pela falta de água para consumo dos animais e famílias, além da visível diminuição do nível de poços e reservatórios que abastecem a cidade e as comunidades do interior. Em novo contato com a reportagem do jornal, o prefeito Bebeto Perdomo disse que em torno de 120 famílias estão recebendo água por meio de um caminhão viniliq pipa. “Os abastecimentos são diários, nos 7 dias da semana. A situação do interior está piorando, propriedades que nunca pediram água, hoje estão com as cacimbas secas”, relatou.

Os números apresentados em relatórios apontam grandes perdas nas plantações de milho, tanto em grão, quanto para silagem, soja e bacia leiteira.

Prefeitos levaram demandas ao governador Eduardo Leite Foto: Itamar Aguiar/Especial TP

GOVERNO DO ESTADO – Os prefeitos da Azonasul participaram de uma reunião com o governador Eduardo Leite, no Palácio Piratini, nesta quarta-feira (4). Em pauta, segundo informações repassadas na noite de ontem a reportagem pelo prefeito de Pedras Altas Bebeto Perdomo, foi solicitado apoio para os problemas ocasionados pela estiagem e uma perda que já chega a R$ 500 milhões se somados os 14 municípios que já decretaram emergência no Estado.

De acordo com Perdomo, a reunião foi bastante produtiva, onde os prefeitos expuseram suas preocupações e solicitaram medidas imediatas ao governo. “Pedimos apoio com relação ao decreto do ano passado pelo excesso de chuvas e que até agora não chegou nenhum auxílio. Outro ponto foi uma reclamação quanto a demora na tramitação da homologação dos decretos por parte da Defesa Civil que está levando em torno de 50 dias, e reivindicação da criação de programas de prevenção de água de açudagem em razão da estiagem. Quanto a ações imediatas, solicitamos para os municípios afetados caminhões pipa, recursos para diesel e deslocamento dos caminhões nos municípios que estão entregando água, caixas de água e horas máquinas de escavadeira e retroescavadeira para fazer aguados para os animais. Por último solicitamos isenção do pagamento de dívidas do programa Troca-Troca e que o governo do Estado gestione junto ao governo federal, programas de negociações de dívidas de agricultores que negociaram as lavoras, pecuária ou bacia leiteira”, relatou Bebeto ao TP, destacando o comprometimento do governador com a pauta.

Uma nota enviada na tarde desta quinta (5), informou que medidas para mitigar os efeitos da estiagem na região já haviam sido tomadas pelo governador Eduardo Leite.

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