PERTURBAÇÃO DO SOSSEGO

Decreto regulamenta o funcionamento de bares e carros com som em vias públicas de Hulha Negra

Documento foi expedido em dezembro do ano passado mas normas ainda são descumpridas

O direito de cada cida­dão termina quando inicia o do outro. Essa frase clichê é utiliza­da para uma infinidade de situações quando o assunto é convivência e normas em uma sociedade. Quando a pauta é perturbação do sos­sego, a ênfase é ainda maior. Isso por que qualquer cida­dão tem o direito de fazer qualquer tipo de atividade e escutar qualquer tipo de som, desde que não perturbe a comunidade.

Existe a crença de que ninguém tem direito de fazer barulho excessivo com perturbação do sossego das 22h de um dia às 5 h do ou­tro, mas isso não é verdade. De acordo com o capítulo quatro (IV) da Lei de Con­travencoes Penais (LCP), no seu artigo 42, no que se refere à paz pública, não se pode perturbar o trabalho ou o sossego alheio nas seguin­tes condições: com gritaria e algazarra; com o exercício de profissão incômoda ou ruidosa, em desacordo com as prescrições legais; com o abuso de instrumentos sono­ros ou sinais acústicos; pro­vocando ou não procurando impedir barulho produzido por animal de que tem a guarda. A penalidade é de prisão de 15 dias a 3 meses ou multa, dependendo do caso. Portanto, não existe uma hora determinada para que qualquer pessoa utilize sons mais altos, que per­turbem o sossego alheio, incomodando vizinhos.

Geralmente quem se sente prejudicado ou incomodado pede auxílio para a Brigada Militar, que determina que o reclamante acompanhe se identificando para o registro policial. Mas, de acordo com o site JusBra­sil, “o reclamante não pre­cisa acompanhar a polícia até a delegacia, já que uma pessoa que notifica acerca de uma infração penal não está cometendo um ato ilí­cito, está antes exercendo o seu direito, não precisando nem se identificar, uma vez que isso poderá causar dissabores pessoais com o infrator”.

HULHA NEGRA No município, as reclamações acerca do alto volume de som em bares e veículos em vias públicas não são recentes. Segundo já in­formado ao TP, ainda em 2018, pela equipe do Meio Ambiente da Prefeitura de Hulha Negra, profissionais já compareceram aos locais de origem de reclamações por parte da comunidade e fizeram algumas determi­nações.

Ainda conforme apu­rado pelo TP, os casos fo­ram parar na Justiça – visto a comunidade poder reali­zar denúncia anônima pelo https://www.mprs.mp.br/atendimento/denuncia/e o Ministério Público cobrou ações por parte do Execu­tivo.

Em dezembro de 2018, o decreto municipal 2.272, de 20 de dezembro, passou a regulamentar o funcionamento de bares e similares no município, assim como deu outras pro­vidências. Em justificativa, o prefeito Renato Machado diz que as medidas foram adotadas no sentido de ga­rantir a ordem e segurança públicas, tendo ainda o obje­tivo de organizar a atividade comercial, onde as regras devem ser conciliadas com as que regem o direito ao sossego dos moradores que residem perto de estabele­cimentos.

CONSIDERAÇÕES Entre as considerações para a expedição do decreto estão a solicitação do Ministé­rio Público Estadual, para que o Município estabeleça horário para o fechamento de bares que estejam pro­vocando poluição sonora; o disposto no inciso XVI do artigo 12 da Lei Orgânica do Município, que trata da competência do Município em fixar horário de funcio­namento de estabelecimen­tos comerciais, industriais de prestação de serviço e ou­tros; a lei municipal 04/93, que proíbe a permissão de algazarra ou barulho que perturbe o sossego público com ruídos e sons excessi­vos; o inciso VII do Art. 199 da Lei Municipal 2044/79, que trata da moralidade do sossego público, proibi perturbar o sossego público com ruído e sons excessivos e desnecessários, sob pena de multa e penas cabíveis ao caso e as várias denúncias junto ao Ministério Público Estadual, sobre perturba­ção de sossego e poluição sonora, por moradores da comunidade, com relação a proprietários de bares.

DETERMINAÇÕES Em razão da legislação, foi de­cretado que bares e similares poderão funcionar das 8h às 23h de domingo a quinta­-feira e feriados precedidos de dia útil, devendo desligar o som às 22h, com tolerân­cia de 30 min e das 8h à 1h de sexta-feira, sábado, vés­peras de feriados e feriados não precedidos de dias úteis, devendo desligar o som às 24h (meia-noite), com tole­rância de 30min.

O artigo quinto diz que bares e similares que oferecerem música por qualquer meio deverão providenciar isola­mento acústico que impeça a propagação do som para fora do prédio, observando as normas técnicas acerca do assunto, bem como as normas legais do município, sendo que o descumprimen­to das determinações pode acarretar multa, cancela­mento da licença para fun­cionamento e a interrupção de suas atividades.

Também é proibida a permanência de automóveis de frequentadores de bares e similares nas proximidades do estabelecimento com aparelhagem de som, interna ou externa, em alto volume. Vale destacar que caso os responsáveis pelos esta­belecimentos se isentarem da situação e não procura­rem os órgãos competentes, também estarão sujeitos às penalidades.

Por fim, o artigo oi­tavo do decreto proíbe a utilização, em veículos de qualquer espécie e em qual­quer horário, de equipamen­to que produza ou reproduza som audível pelo lado exter­no, independentemente do volume ou frequência, que perturbe o sossego público.

O relato de quem convive com o som alto

O TP conversou com uma moradora de Hulha Negra, residente das proximidades do ginásio municipal. Ela contou à reportagem situações passadas por ela e vi­zinhos. Elizabeth Silveira aproveitou para cobrar soluções das autoridades. Veja o relato: “Tudo começa na sexta e termina no amanhecer para segunda-feira. Som altíssimo em vários comércios, carros com som de tremer as janelas da casa, motos e automóveis em correrias pelo centro da cidade. Ligamos para a polícia e dizem que não podem, que para virem tem que registrar um boletim de ocorrência. Mas temos nossos direitos, reclamamos para vereadores que dizem não poder fazer nada porque aqueles que não respeitam são conhecidos e que a cidade é pequena. Não temos ninguém para fazer cumprir a lei. Ligamos para o Ministério Público, tem várias queixas, e lá dizem que mandam notificações para a Prefeitura. Daí fica a pergunta: Quem pode resolver?”, questiona.

A moradora conta também como é a rotina de quem trabalha e precisa conviver com o som alto no fim de semana. “Sexta-feira começa tudo e sábado todo mun­do trabalha. Já passaram a noite sem dormir com o som alto, gritos e brigas na rua. Depois do trabalho no sábado vão pra casa descansar e novamente a bagunça continua, outra noite amanhecendo pra domingo dormindo mal pelo barulhos dos atos. Chega domingo à noite, a pessoa espera dormir bem para se recuperar das noites anteriores e recomeçar a semana a situação continua no domingo e se estende até 4, 5, 6h da manhã de segunda-feira. Será que somos nós prejudicados que temos que ficar calados aguentando tudo?

Sem falar que não podemos assistir uma televisão por causa do barulho. Cadê nossos direitos? Cadê as autoridades da nossa cidade? Cadê nossa polícia? Não temos policiamento, à noite vão tudo embora para Bagé; Cadê os responsáveis pelos alvarás dos comércios? Cadê a fiscalização da nossa cidade? Cadê o cumprimento das leis? Para que servem nossos direitos se ninguém cum­pre?”, manifesta.

Ao relatar as situações à reportagem do TP, ela também faz comparações. “Um baile tem hora para ini­ciar e terminar, certo? Exige toda segurança humana e proteção obrigatórias para cada evento. E daí qualquer estabelecimento vai fazer danceteria, sons altíssimos tirando a privacidade das pessoas que trabalham e pagam seus impostos legalmente? Isso é errado!”, questiona.

O que diz a Prefeitura

A reportagem do TP contatou com o Setor de Tributos da Prefeitura de Hulha Negra, vinculado à Secretaria de Finanças – órgão competente pela aplica­ção do decreto – para informações quanto ao cumprimento do decreto. Segundo repassado à reportagem, algumas reuniões devem definir as medidas tomadas para o cumprimento legal do decreto. Em nota, a assessoria de Imprensa da Prefeitura de Hulha Negra informou que “o decreto publicado no final de 2018 orienta os donos de estabelecimentos sobre as questões de ‘convivência’ dos comerciantes com a vizinhança. A Administração faz fiscalização diurna em estabelecimentos, porém, está ciente que as reclamações sobre poluição sonora é mais constante à noite. Para isso, está adotando medidas relacionadas à segurança pública como, por exemplo, alinhando com o comando militar para que destine um efetivo maior para o município e em horário diário completo”.

 

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