“Qual o custo da mentira?”

É com essa frase que o professor e ex-membro da Academia de Ciência da ex­tinta URSS, Valeri Alexeevitch Legasov, começa e termina a aclamada série/documentário “Chernobyl”, que retrata os even­tos que permearam o maior desastre nuclear da história, cujos efeitos para a continuidade da vida no Planeta Terra poderiam ter sido desastrosos não fosse a inestimável contribuição dada pelos cientistas para desfazerem o efeito “dominó” gerado por uma série de pequenas, médias e grandes mentiras que começa­ram a se acumular de tal modo que, para corrigi-las, o custo acabou sendo a desintegração da própria União Soviética. Isso afirmado anos mais tarde pelo ex-Presidente Mikhail Gorbachev. Além, por óbvio, da perda desnecessária de milhares e milha­res de vidas humanas enquanto se tentava em vão sustentar mentiras que eram desmascaradas a cada segundo pelo mais terrível e implacável de todos os juízes: o MUNDO DOS FATOS. E a inevitabilidade do aparecimento das suas consequências. Afinal, quando for a hora, vai chover, quer eu diga que sim, quer eu diga que não. Assim como a radioatividade em níveis mor­tais se espalhou, dissessem o que dissessem os governantes.

E mais do que a história em si, que já é maravilhosa e envolvente do primeiro ao último segundo, talvez o mais inte­ressante seja a necessidade clara que ela evidenciou de que a ciência e a política não se misturem. Algo que parece bem atual em tempos de enfrentamento da pandemia da COVID-19, com os políticos e sua tentativa de encontrar soluções mági­cas, fáceis e rápidas, contrastando com os cientistas pregando cautela, cuidado e preservação enquanto não se chega a um consenso técnico de como agir. Enfim, políticos sendo políticos; cientistas sendo cientistas. E a história se repetindo…

O que não muda é o que parece ser a necessidade de se estar sempre mentindo. Seja sobre radioatividade seja sobre currículos. Atualmente vejo que muitos estão assombrados por uma “novidade” chamada fake news, que de nova só tem o nome. Um ilustre advogado que conheci diria que fake news é “um nome novo para uma ‘cousa’ muito antiga”. De fato. Desde que o mundo é mundo a mentira institucional está presente. Assim como a tentativa de combate a ela. Portanto, nenhuma novidade nisso. O novo talvez esteja no tamanho do estrago que elas passaram a causar com a chegada – essa sim uma tremenda novidade – das redes sociais e do seu uso compul­sivo, para o bem e para o mal. Aqui no Brasil, pelo menos, o fenômeno das fake news alcançou um estágio tal que temos dois dos chamados Poderes da República debruçados na ta­refa ingrata de tentar limitar o seu avanço. O Poder Judiciário, ocupado com o tal “inquérito das fake news”, por muitos con­siderado a maior aberração do sistema judiciário brasileiro. E o Congresso Nacional, ocupado com o projeto de lei nº 2.630, batizado de “Lei do Cala a Boca”, já aprovado no Senado Fe­deral, e muito criticado por aparentar uma espécie de tentativa de legalizar a censura prévia.

E você vai me perguntar: “Tá bom, mas onde está a minha liberdade de expressão?” Ora, tá na CONSTITUIÇÃO. Na mesma Constituição que também veda a censura. E que garante o direito à CORRETA INFORMAÇÃO, assim como o direito à preservação da intimidade, da honra, da vida privada, da imagem das pessoas e de ser indenizado pela violação a qualquer deles.

Todos direitos do mesmo tamanho e com o mesmo peso. E todos direitos que não podem ser exercitados de forma ILIMITADA. Aliás, nenhum direito pode. Nem o direito à vida.

Daí você vai me perguntar: “Tá bom, mas então como eu faço para descobrir o limite de cada um deles?” Certamente se eu tivesse a resposta para essa espinhosa questão eu não estaria aqui escrevendo estas parcas linhas, mas dando consultoria em dólar pelo mundo afora. Mas eu desconfio, que­rido leitor e querida leitora, que um bom início para a resposta seja aquela lição que todos nós aprendemos quando ainda éramos crianças, e que talvez seja o maior limite ético para qualquer dúvida: O MEU DIREITO VAI ATÉ ONDE COMEÇA O DO OUTRO.

E afinal, quanto custa uma mentira? Honestamente, eu não sei, mas os exemplos são sempre trágicos. A maior de todas as mentiras institucionais, talvez a mãe de todas as fake news, idealizada e propagada pelo então Ministro da Propa­ganda nazista Paul Joseph Goebbels, custou o maior conflito armado da história e algo em torno de 70 a 85 milhões de vidas. E quem não lembra do famoso caso da Escola Base, no bairro da Aclimação, em São Paulo, ocorrido em 1994 e considerado ainda hoje o maior escândalo da história da imprensa brasilei­ra? O seu custo está sendo contado pelo filho das vítimas em livro que será publicado ainda este ano (O Filho da Injustiça).

Portanto, agora sou eu que lhe pergunto: “Mentiras sin­ceras ainda lhe interessam?

Boa semana e até a próxima!

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