MÊS DO ORGULHO LGBTQIAPN+

Candiotense transexual fala sobre a mudança de gênero e os desafios enfrentados

Arthur Veleda Rodrigues começou a transição em 2022 e está no processo de troca dos documentos

Arthur destacou a importância de respeitar as escolhas do próximo Foto: Sabrina Monteiro TP

Neste dia 28 de junho, comemora-se o Dia Internacional do Orgulho LGBTQIAPN+. A data começou a ser comemorada após os protestos que tiveram início nos Estados Unidos, conhecidos como a Revolta de Stonewall, em Nova York, quando um grupo enfrentou a repressão e a violência policial por seus direitos. Para registrar a data, a reportagem do jornal conversou com o jovem candiotense, Arthur Veleda Rodrigues, 22 anos, que é um homem transexual (nasce do sexo feminino, mas se identifica e vive como homem) e começou a sua transição em 2022. Atualmente está passando pelo processo de troca dos documentos.

 

O COMEÇO

 

Arthur contou que sempre se sentiu um menino, mas demorou para se assumir por medo de ser rejeitado por pessoas próximas. Ele relembrou que quando começou a frequentar a escola, sempre utilizava o banheiro masculino e se sentia confortável com o pronome “ele”. “O tempo foi passando e eu me sentia mal e desconstruído, foi quando contei para um amigo próximo como eu me sentia e recebi total apoio. Logo aproveitei para contar para a minha mãe, e ela também me compreendeu. Claro que foi e ainda é muito difícil, mas não vou deixar de ser quem eu realmente sou”.

Durante a infância, Arthur relatou que sofreu muito preconceito, principalmente na escola, tanto por alunos como também por professores. Contou que sempre era questionado se era menina ou menino, pelo modo de se vestir e agir, mas sempre respondeu que era menina por medo de ser tratado com indiferença, que segundo ele, era inevitável. Ele contou que aos poucos começou a ficar revoltado no ambiente escolar, não prestava atenção nas aulas e não tinha um bom comportamento. “Quando eu tinha uns 12 anos nos mudamos para Santa Catarina e moramos um tempo com o meu irmão. Eu não tinha contado nada pra ele, mas ele já sabia de tudo e sempre disse que iria me ajudar na escola e me apoiar. Lembro que fiquei com muito medo de ir no primeiro dia de aula, porque sofri muito na escola com perguntas desconfortáveis, mas felizmente acabei fazendo amigos lá”, falou, informando que algum tempo depois ele e a mãe retornaram para Candiota.

 

HOMEM TRANS

 

Sobre ser um homem trans, o jovem destacou que todos os dias enfrenta um desafio diferente, e que precisou entender que nem todas as pessoas entendem o seu posicionamento, mas que muitas vão prestar apoio e auxiliar no que for preciso. “Quando eu me assumi um homem trans, muitas pessoas se afastaram e muitas me acolheram. É muito difícil ser LGBT, e não precisar fazer parte da comunidade para ver que é difícil conseguir emprego ou um lugar na sociedade. Qualquer coisa que pareça normal para um hetero, para nós muitas vezes é uma conquista”, lamentou.

Ainda, ele mencionou que muitos falam  sobre amor e não sabem o que é, pois o amor, segundo ele, também é feito por atitudes. “Eu achava que a minha avó iria me rejeitar e deixar de me amar por ser da igreja, mas ela sempre esteve ali quando eu precisei. Quando eu contei para a minha família sobre gostar de meninas, ela me disse algo que se não me amasse como eu sou, o mundo lá fora ia pegar pesado comigo. E que se eu recebesse amor em casa, por mais difícil que o mundo seja, eu sempre teria um refúgio e um ombro para chorar”, comentou, reforçando que independe da religião de cada um, é preciso respeitar o próximo.

Durante a conversa, ele mencionou a dificuldade em conseguir emprego no município, dizendo que muitas vezes não teve oportunidade de ao menos participar de alguma entrevista. “Sei que emprego está difícil, mas tenho certeza que muitas vezes não consegui por falar que era homem trans”.

Ao finalizar, Arthur ressaltou o apoio e acolhimento que está recendo da equipe da Secretaria de Mulher, LGBTQIAPN+ e Igualdade Racial, da mãe e dos irmãos. “Sou grato por todas essas pessoas que me respeitam e estão sempre fazendo o que podem. Sei que cada um tem a sua cultura e o seu jeito de pensar, mas quando sabemos amar e respeitar, aprendemos que também podemos amar o próximo da mesma maneira”.

No momento, ele está em busca da troca de documentos no Cartório candiotense para, finalmente, ser reconhecido oficialmente da forma que sempre quis.

 

APOIO DA SECRETARIA

 

Em conversa com a atual responsável pela Secretaria da Mulher, LGBTQIAPN+ e Igualdade Racial, Juliana Baumhardt, ela explicou que a equipe presta total apoio às pessoas que desejam fazer a alteração do nome ou algo que esteja no alcance da Secretaria.

Na oportunidade, ela também informou que sempre realizam uma reunião com a pessoa para saber o que ela precisa, e então encaminham para o jurídico ou para o atendimento com o psicólogo, dependendo da situação de cada um. “Essa parte do nome funciona de duas maneiras, alteração e retificação. Na alteração a pessoa muda apenas o nome social que será utilizado no ambiente escolar e no mercado de trabalho, por exemplo. Se for retificação o processo é mais demorado e detalhado, pois é realizado no cartório e desde a certidão de nascimento é alterada, o sexo e tudo mais”.

Em casos como o Arthur, por exemplo, que não sabia o que fazer primeiro e quem procurar, Juliana disse que a Secretaria disponibiliza ajuda, e que tudo é encaminhado conforme a necessidade de cada um. “Nós temos uma parceria e um convênio gratuito com a Universidade da Região da Campanha (Urcamp), onde eles oferecem atendimento jurídico e psicológico também”, ressaltou, dizendo que foi uma ótima solução.

 

QUAL VALOR PARA ALTERAR OS DOCUMENTOS?

 

A reportagem do jornal também conversou com a substituta do Cartório de Candiota e responsável pela troca da documentação, Pâmela Peçanha, que informou sobre o que é necessário para fazer a alteração e quanto custa.

Sobre o valor que é preciso, Pâmela disse que a pessoa interessada, caso não tenha condições, pode solicitar a mudança de forma gratuita, ou também pagar o valor de R$ 180 pelo processo. “Nesse ano eu já realizei duas trocas de pessoas aqui da cidade, mas por enquanto não é algo que todo o mês tenha procura. Talvez agora as pessoas comecem a procurar mais, porque ficou mais fácil e não precisa entrar com processo judicial. Mas geralmente, o espaçamento de uma para outra é em torno de seis meses”, comentou ela.

Em relação ao tempo de espera, a profissional disse que tudo depende da entrega da documentação do interessado. Além disso, ela também comentou que em função da enchente no Estado alguns setores ficaram sem acesso, mas geralmente o processo é rápido. “Nós tentamos fazer tudo o quanto antes, pois sabemos da importância que tem na vida das pessoas. Sabemos que elas querem os novos documentos o quanto antes, então eu tento fazer tudo no mesmo mês em que a pessoa dá entrada”, pontuou, afirmando que é preciso ser maior de idade.

Para o processo é necessário levar a certidão de nascimento atualizada; certidão de casamento, se for o caso; cópia do RG; cópia da Identificação Civil Nacional (INC), se for o caso; cópia do CPF; cópia do título de eleitor; cópia da carteira de identidade social, se for o caso; comprovante de endereço; certidão do distribuidor cível do local de residência dos últimos cinco anos; certidão de execução criminal do local de residência dos último cinco anos; certidão da Justiça Eleitoral do local de residência dos últimos cinco anos; certidão da Justiça do Trabalho do local de residência dos últimos cinco anos e certidão da Justiça Militar, se for o caso. Ainda, ela informou que o interessado “precisa estar ciente e concordar que não será admitida outra alteração de sexo e prenome por este procedimento, exceto na via administrativa, com decisão do juiz competente, ou na via judicial.”

ORIGINALMENTE ESTE CONTEÚDO FOI PUBLICADO NO JORNAL IMPRESSO*

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