CARTAS PARA ALICE

Jornalista bageense que perdeu a batalha para o câncer, deixou cartas para a filha

O marido Maurício Oliveira dá continuidade às cartas e lançou o projeto FAM para ajudar outras pessoas

Fran e Maurício estavam juntos há 17 anos e Alice sempre esteve nos planos Foto: Arquivo Pessoal TP

A jornalista bageense Francine Leite, Fran como era chamada pelos amigos, morreu aos 34 anos, em fevereiro de 2022. Vítima de um câncer de mama, inventou uma forma de sobrevida, para estar presente na vida da filha que ficou sem a mãe com pouco mais de um ano, criando um projeto pessoal chamado “Cartas para Alice”.

Uma semana depois de receber o diagnóstico que foi em 27 de janeiro de 2021, Fran escreveu a primeira carta, postada no seu instagram, acompanhada de uma foto em que ela se arruma em frente ao espelho. Na carta ela começa dizendo que é o dia em que começa a enfrentar a doença. “Minha amada filha, Alice. (…) Depois da rotina de cuidados contigo, fui me preparar para um dos momentos mais importantes da nossa vida. Hoje filha, tua mãe que, há mais ou menos uma semana recebeu, sem conseguir compreender, o diagnóstico de um ingrato, improvável e incomum câncer de mama, decidiu se arrumar para conhecer as armas dessa batalha”, escreveu.

Fran era sempre muito otimista em suas cartas, falava em cura e superação, deixando a mensagem para a filha que era para enfrentar as adversidades de cabeça erguida. No entanto, Fran que passou por quimioterapia, cirurgia e radioterapia não conseguiu vencer o câncer. Hoje, o seu marido, com quem estava há 17 anos, Maurício Oliveira, dá continuidade às cartas e criou o projeto “FAM” (Fran, Alice e Maurício) na tentativa de ajudar pessoas que estão passando ou passaram por situação semelhante.

O CÂNCER – Em entrevista ao TP, Maurício que é gerente de investimentos do Sicredi, relatou que a doença teve o seu desenvolvimento na gestação. A gravidez mascarou os primeiros sinais. “Era um carcinoma na mama esquerda que começou a incomodar na amamentação da Alice, ela tinha muito inchaço, dor e dificuldade na pega, foi o que ligou o alerta. Mesmo com orientação, que dizia para ela se tranquilizar, Fran insistiu para fazer exames, uma ecografia acabou sugerindo que o problema era mastite. Com outro médico, surgiu a suspeita de algo mais sério. Dias depois, a confirmação: neoplasia maligna, descobrimos no dia do meu aniversário, ficamos sem chão”, relatou.

AS CARTAS – Fran deixou algumas cartas prontas para Alice e alguns rascunhos. Um dia após seu falecimento, Maurício postou sua carta de despedida, ela começa dizendo que está voltando para casa e que tem que ir para longe, mas que é apenas por um tempo. “(…) Não pode vir comigo desta vez, você tem seu próprio destino e agora minha menina vai me perder. Não meu amor, eu não quero ir, mas saiba que eu tenho que ir. Olha como o câncer cresceu, acho que é hora de voltar para casa… cada respiração ficando mais difícil. Eu posso ouvir as lágrimas vindas da minha filha. Ela não tem muita certeza sobre a vida ou como isso poderia estar certo, mas eu sei que meu bebê vai ficar bem porque ela pode falar comigo a qualquer hora porque o paraíso não está muito longe, e eu sei que algum dia você vai visitar. Eu não achei que fosse ser assim, achei que teríamos mais tempo juntas (…)”.

Maurício conta que atualmente ele segue escrevendo as cartas. ”Eu tento manter ela próxima da filha e a filha próxima dela, às vezes escrevo como ela pensava, já que a gente se conhecia bem e às vezes como se fosse eu também, eu não escrevo tão bem quanto ela, já que ela era jornalista e formada em letras, mas eu tento”, relatou.

FAM – Como já mencionado, o projeto que leva como nome as iniciais da família, ia ser o nome de uma empresa familiar. “Nós pensávamos em abrir uma empresa para prestarmos serviços, dentro de nossas áreas, mas como ela veio a falecer, resolvi usar pra ajudar alguma causa, pra poder mantê-la viva, para que mais pessoas possam conhecê-la. No ano passado fizemos um brechó com as roupas da Fran, arrecadamos em torno de R$ 3 mil para o projeto “Segura”, eles fazem bolsinha para carregar o dreno e almofadinha para pacientes que fizeram a mastectomia”, relatou.

A ideia, segundo o Maurício é realizar todos os anos no aniversário dela, que é em julho, alguma ação para ajudar algum projeto. “O FAM serve também para que as pessoas lembrem-se dela, e a Alice sempre estará presente, até para que ela conheça a mãe por outras pessoas, com alguma história. No aniversário da Alice mesmo, muitos amigos da Fran estavam presentes, porque muito do carinho que eles tinham pela mãe dela, eles tem por ela, já que a mãe dela não vai estar presente pra dar um carinho para ela, vai estar de outras formas”, afirmou.

FRAN – A Fran também era formada em letras pela Unipampa e segundo Maurício, ela fez letras para trabalhar e juntar dinheiro para fazer jornalismo que era o seu sonho, tendo se formado em jornalismo pela Urcamp. Ela também fazia publicidade em vídeo para alguns comércios, tendo por último trabalhado no jornal de Bagé Folha do Sul e também atuado em curtas-metragens. Apaixonada por teatro e cinema, viu Dolores, estrelado por ela, ser vencedor da Mostra Regional do Festival de Cinema da Fronteira.

ALICE – Segundo Maurício, a Alice sempre esteve nos planos. “Desde que éramos mais novos, eu sempre falava que ia ser pai de menina. Casamos em 2019 e ela engravidou no início de 2020. A gente queria fazer tudo certo, namorar, noivar, achar um emprego bom, casar e ter dois filhos, mas com a partida precoce da Fran os planos foram interrompidos, são coisas que a gente não entende porque acontece, mas tentamos seguir em frente, principalmente pela Alice”, concluiu.

ORIGINALMENTE ESTE CONTEÚDO FOI PUBLICADO NO JORNAL IMPRESSO*

Comentários do Facebook