Uma doença muito traiçoeira. É assim que descreve o médico candiotense, Antônio Lafayette, ao ser questionado pela reportagem sobre o câncer de próstata. Neste mês, em 21 países, ocorre a campanha “Novembro Azul” e o objetivo principal é alertar a respeito da prevenção e importância do diagnóstico precoce da doença. O Tribuna do Pampa não poderia fazer diferente e por isso procurou um profissional para tratar do assunto e esclarecer as dúvidas da população.
PRÓSTATA – A próstata é uma glândula do sistema genital masculino, localizada logo abaixo da bexiga urinária. O câncer de próstata surge quando há um crescimento desgovernado das células da próstata. As células cancerígenas são capazes de se multiplicar e invadir órgãos vizinhos ou se espalhar para outras regiões do corpo, gerando metástases. O câncer de próstata é o tumor maligno mais frequente na população masculina depois do câncer de pele.
SINTOMAS – Quando se fala em doença, a primeira dúvida que surge é quais são os sintomas que ela apresenta? No caso do câncer de próstata, Antônio Lafayette foi franco ao dizer que pode ocorrer de nenhum sinal estranho se manifestar e é aí que está o risco. Em resumo, o alerta fica para a dificuldade na hora de urinar, em segurar a bexiga com urina e a presença de sangue na urina. “O homem não sente absolutamente nada no início desta doença, quando ele começa a ter sintomas significa que a doença já está avançada. Nesses casos, o indivíduo vai se dar conta quando começar a fazer um esforço muito grande para urinar, coisa que antes ele fazia normalmente. O segundo sintoma interessante é que ele pode começar a apresentar dificuldade em segurar a bexiga com urina por muito tempo, ele urina em um determinado momento e dali uma ou duas horas depois já está com vontade de urinar novamente e levanta-se a noite quatro ou cinco vezes para urinar”, explicou.
Apesar disso, o médico disse que esses sintomas são muito mais comuns em casos de tumor benigno do que em casos de câncer, por isso é tão importante procurar um especialista. “A próstata também tem um tumor benigno que é chamado hiperplasia prostática benigna – uma doença que não mata o indivíduo, só se houver complicação nos rins, mas também se apresenta dessa forma. A necessidade de fazer força para urinar são indicativos de que a próstata aumentou de tamanho. Isso acontece porque a próstata costuma aumentar progressivamente depois dos 35 anos e, aos 50, metade da população masculina tem um grau de aumento da próstata. Ele pode nem ter sintomas, pode estar urinando direitinho porque o canal da urina não foi fechado, também pode não estar urinando muitas vezes por dia porque o canal da próstata cresceu, mas não a ponto de invadir a bexiga. No câncer isso pode acontecer, mas nem sempre acontece esse esforço, vai depender em qual região da próstata esse tumor se encontra”, disse.
Para a reportagem, o médico disse explicar todas essas questões para que haja o entendimento de que nem sempre os sintomas sugerem o mesmo diagnóstico, mas é preciso ficar em alerta. “Um homem depois dos 40 anos urinando sangue tem que ser pesquisada a forte possibilidade do câncer de próstata. Não é a única causa, ele pode estar com uma infecção urinária ou na própria próstata. Se um homem apresentar dificuldade de soltar a urina como sempre soltou e começa a urinar muito mais vezes que urinava antes, evidentemente que isso não é algo exclusivo da próstata porque o diabético também começa a urinar muitas vezes, então por isso precisa haver intervenção de um médico, é o profissional que vai ser capaz de avaliar essas situações”. Segundo Lafayette, a recomendação é que, após os 40 anos, os homens façam uma revisão anualmente.
EXAMES – Para o diagnóstico do câncer de próstata, o médico disse ser necessário realizar três exames: de sangue, uma ultrassonografia feita pelo abdômen e o exame de toque retal. “Esse exame de sangue é uma pesquisa do PSA (da sigla inglesa Prostate Specific Antigen), uma proteína que a próstata possui e que todo homem tem, só que ela não pode ultrapassar um limite específico. Quando passa o médico analisa a possibilidade de estar havendo algum problema. É bom lembrar também que PSA elevado não é obrigatoriamente câncer de próstata, porque aquele aumento normal da próstata devido a velhice, que não é câncer, é benigno, pode fechar o canal da urina e dificultar a micção, também pode se manifestar com elevação do PSA no sangue”, explicou.
O segundo exame para o diagnóstico inicial do câncer de próstata é a ultrassonografia – feita pelo abdômen e não pelo ânus. Com essa ultrassonografia o médico observa se a glândula está aumentada ou não e se existe algum nódulo suspeito. “Já o terceiro exame é o que cria um certo constrangimento, mas apenas de questão emocional, o do toque retal, que é absolutamente indolor. O médico coloca uma luva, passa um gel no dedo e introduz esse dedo aproximadamente cinco centímetros na região anal do paciente. O exame leva 10 segundos e a intenção é palpar a próstata com a ponta do dedo e verificar se ela está dura, se existe um caroço em algum ponto ou se ela está aumentada. Depois existe ainda a biópsia: quando esses três exames sugerem um câncer, o médico utiliza um microscópio e, com aumento de 100, 200 e até 400 vezes, as células cancerosas ficam muito nítidas e aí o diagnóstico é de certeza absoluta. Os outros exames são indicativos e a biopsia dá certeza absoluta da existência de um câncer”.
ANUAL – Em seu consultório, nos atendimentos pelo Sistema Único de Saúde (SUS), onde atua em Candiota, Lafayette disse que solicita a todos os homens com mais de 40 anos de idade que façam o PSA anualmente – independente da existência de sintomas. “O PSA não resolve tudo sozinho e a estatística mostra isso: em cada 10 homens com câncer de próstata, dois deles estão com o PSA normal e oito estão com o PSA elevado. Isso quer dizer que o indivíduo pode ter câncer de próstata com PSA normal e isso acontece em 20% dos casos. Ele pode estar no meu consultório com câncer, mas o exame estava normal. Por isso tem que também fazer o exame do toque retal. Se o urologista perceber o endurecimento ele vai solicitar uma ultrassonografia que pode ser por via abdominal (como as mulheres grávidas), mas existe também a transretal, que mostra uma imagem de melhor qualidade e que permite a biopsia para se ter certeza”. Nesses casos de câncer, segundo ele, no início, a próstata pode estar com tamanho normal e é fundamental o homem comparecer ao consultório de um urologista de sua confiança para verificar.
TRATAMENTO E CUIDADOS – De acordo com o médico, o tratamento é realizado através de cirurgia para retirada da glândula e também quimioterapia e radioterapia, de acordo com avaliação médica. “Só um especialista poderá dizer como o caso será resolvido. Há casos em que é preciso as três situações. Se o câncer for diagnosticado antes de metástase ele tem cura. O problema é que o câncer de próstata é silencioso e se o homem não se sujeitar a esses exames anualmente ele pode começar com os sintomas de metástase: o câncer invade principalmente para os ossos e a dor óssea é intensa; também pode invadir para a medula, canal do sistema nervoso central, então o indivíduo apresenta sensibilidade nas pernas ou nos pés. Fato é que a medicina é algo muito complexo, não é só o câncer de próstata que faz isso, o indivíduo caiu de moto e ele pode ter um traumatismo de medula e apresentar essa sensibilidade também, por isso é preciso fazer essa consulta com um médico para fazer essa diferenciação dos diagnósticos”, alertou.
Conforme lembrou, existem fatores genéticos que estabelecem a doença e não é possível evitar que o indivíduo tenha, mas é sempre importante cuidar os hábitos. “Sabe-se que o tabagismo aumenta a incidência de casos de câncer de próstata, entre os fumantes existe mais ocorrência de câncer de próstata do que entre não fumantes, mas quem não fuma também pode ter câncer de próstata, qualquer homem a partir dos 35 ou 40 anos, com mais frequência a partir dos 50; os homens obesos têm mais câncer do que os magros, mas isso não quer dizer que os magros não terão câncer”.
De acordo com o médico, também há uma relação entre depressão e estado imunológico que considera importante. “As pessoas mais deprimidas emocionalmente têm mais câncer em geral do que as pessoas não deprimidas. Hoje em dia se sabe que o sistema imunológico é agredido em algumas doenças, entre eles a depressão, por isso recomenda-se ter uma vida com paz, amor, harmonia familiar e um casamento bem ajustado como é o meu. Isso leva a uma paz muito grande e ajuda o sistema imunológico. O câncer tem uma vertente genética, que não se consegue evitar, mas se você não fuma, não abusa do álcool, não tem estresse, não come gordura e fritura em excesso, também é importante”.
TABUS – Questionado sobre como avalia a dificuldade que os homens têm de procurar atendimento médico e até mesmo do preconceito em realizar exames como o de toque retal, Lafayette ressaltou ser uma questão cultural e disse haver muito machismo no Rio Grande do Sul. Através do jornal, ele também solicitou que as mulheres levem seus maridos os médicos. “Tenho 48 anos de medicina e entre as minhas especialidades eu já examinei ao todo mais de 50 mil pessoas e, vou dizer o seguinte, o homem pensa mais ou menos assim: eu estou bem, não estou sentindo nada e, se eu for ao médico, ele vai me examinar e achar uma doença em mim. Aqui nos postos de saúde de Candiota onde eu atendo, 80% do público é mulher, por isso que eu costumo dizer quase que em tom de brincadeira, mas é sério, que existem mais viúvas do que viúvos andando por aí. Os homens morrem mais e deixam elas viúvas. São elas que vão frequentemente ao ginecologista e ao clínico geral, enquanto eles acham que nós vamos procurar doença para eles e não é isso”, disse.
Para ele, é essencial que as crianças sejam conscientizadas sobre a importância dos diagnósticos precoces e fazer visita aos consultórios de forma regular. “Isso dos homens não procurarem atendimento é cultural no mundo ocidental. Para que as novas gerações quebrem esses tabus vai depender da educação dos pais, se eles não educarem os filhos e deixarem para o mundo, o mundo vai seguir educando desse jeito que estamos vendo: as mulheres vão ao médico por qualquer coisa e os homens não vão por nada. A gente resume essa história toda da seguinte maneira: para prevenir doenças da próstata – seja benigna ou câncer, a partir dos 40 anos todos os homens têm que ir ao médico todo ano e é o médico que vai decidir o melhor caminho para ele”, finalizou.