EDUCAÇÃO

Projeto escolar “Apagados da história” relembra os Lanceiros Negros em Candiota

Estudantes pesquisaram a história e criaram uma dança com encenação Foto: Divulgação TP

Um trabalho escolar tem chamado a atenção da comunidade de Candiota e região, o projeto “Apagados da História – Reconhecendo a História dos Lanceiros Negros”, realizado por alunos do 8º ano e Educação de Jovens e Adultos (EJA) da Escola Municipal de Ensino Fundamental Neli Betemps, localizada no bairro João Emílio, na disciplina de história.

O trabalho possui como professora orientadora Juacema Costa Lima, coorientadoras Tamires Rosa Soares e Maitê Dias Ribeiro e o professor intérprete Tiago Mengotti Alves, além da colaboração dos pinheirenses Emerson Souza Pontes, Gezer Tavares, Marcia Silveira, padre Elautério Junior, Sandra Farias e Simião Silva Barbosa.

O Apagados da História foi apresentado na 10ª Feira de Ciências de Candiota (Feican), e selecionado para a 12ª Feira de Ciências do campus Bagé da Universidade Federal do Pampa (Unipampa), participando também da 3ª Fecipampa.

“Agradeço de coração em nome da Escola Neli Betemps pela oportunidade, participação e envolvimento de todos. Foi um projeto que envolveu outros trabalhos como palestras e orientações com pessoas da comunidade, que passaram informações e relatos históricos, além de experiências. As pessoas devem pensar como um trabalho de história foi parar na Feira de Ciências, mas as ciências humanas também devem ser valorizadas porque há todo um estudo e a história é uma ciência humana. Foi fantástico elaborar o projeto e ver que ele alcançou um resultado além do esperado”, expôs a professora orientadora Juacema Costa Lima.

SOBRE O PROJETO

 

Em conversa com o Tribuna do Pampa, a professora Juacema Costa Lima explicou que o projeto começou quando foi lançado o edital da Feican e remete a um dos acontecimentos mais marcantes do Rio Grande do Sul, a Revolução Farroupilha. “Nesse período o Brasil era um país escravocrata e os líderes da revolução recrutaram os negros escravizados para que lutassem ao seu lado em troca da tão sonhada liberdade. Com o decorrer da Guerra, esse grupo ganhou um papel de destaque e transformou-se na vanguarda das tropas farroupilhas, ficando conhecidos como Lanceiros Negros. A revolução já se estendia por quase 10 anos e a liberdade prometida aos Lanceiros Negros se tornou um impasse nas negociações de paz, pois não era aceita pelo Império. Assim na madrugada de 14 de novembro de 1844 em Porongos, hoje município de Pinheiro Machado, esse impasse chegou ao fim, os Lanceiros Negros, desarmados e desprotegidos foram massacrados numa ‘surpresa’ que há décadas vem sendo discutida por historiadores, que buscam reescrever esse triste capítulo da nossa história. Esse episódio ficou conhecido como o Massacre de Porongos”, relatou a professora.

Questionada sobre o objetivo da pesquisa, Juacema disse que o foco era saber o “porquê da enorme contribuição dos negros nessa luta ser a menos estudada e conhecida da história da Revolução Farroupilha, constituindo uma grande controvérsia na historiografia do Rio Grande do Sul, apagando o destacado papel dos célebres Lanceiros Negros”.

Sobre os resultados do projeto, a orientadora ressaltou ter sido uma oportunidade para o aprendizado dos alunos, além de um impulso para que fosse despertado o senso de justiça. “A história fez brotar o desejo de viver em uma sociedade mais justa e igualitária, buscando resgatar valores muitas vezes esquecidos, utilizando a educação como meio de resignificação da nossa sociedade, promovendo inclusão e despertando a consciência crítica através deste resgate histórico, que não só interessa aos negros, mas a todos que lutam pelas liberdades humanas, visto que as marcas da escravidão ultrapassaram gerações e se refletem até os dias atuais, fazendo com que o racismo seja uma das formas mais expressivas de preconceito”, disse Juacema.

Professores, alunos e colaboradores do projeto durante as gravações do vídeo Foto: Divulgação TP

VÍDEO

 

O grupo ainda gravou um vídeo no Sítio dos Porongos relatando a história e está preparando um curta metragem intitulado “Apagados da História – O Filme”.

ALUNOS

 

A turma responsável pelo projeto é composta pelos estudantes Alerrandra Gois Munhoz, Kálitta Eliza Gonçalves de Oliveira, Laryssa de Souza do Couto, Melyssa Medeiros Rosa, Tayani Pedroso da Silva, Yana Brasil Lopes, Érick Moisés Pinheiro Silveira, Edyvan dos Santos Gonçalves, Jhordan Cassal Batista, Ricardo Pinheiro Silveira e Wéslen Silva da Silva.

INCLUSÃO

O projeto Apagados da História também faz referência a inclusão. Dois alunos são PCD (Pessoa com Deficiência), os irmãos Érick Moisés Pinheiro Silveira e Ricardo Pinheiro Silveira, que participaram da dança e do vídeo por meio do auxílio do professor intérprete, Tiago Mengotti Alves. Ao TP, Juacema ainda contou que Ricardo, apesar da deficiência auditiva, dança e faz a fala em vídeo em língua de sinais – Libras.

 

SENTIMENTO DAS ALUNAS

 

O TP recebeu o depoimento de três alunas participantes do Apagados. Para Melyssa “foi uma sensação muito emocionante trazer essa história que já havia acontecido, não foi fácil, tivemos que estudar muito sobre ela, conhecer cada detalhe para trazê-la ao público, quando a gente fez a primeira apresentação foi uma sensação única, sentir a emoção das pessoas ao nos prestigiar, pois várias pessoas não conheciam essa história que aconteceu há tanto tempo atrás. Foi muito gratificante participar desse trabalho, mas saber que nos dias de hoje às pessoas ainda sofrem com o racismo é muito triste”.

Tayani descreveu o trabalho como incrível. “A gente conheceu uma história triste, mais uma história que deve ser lembrada, muitas pessoas não conheciam e quando conheceram acharam muito linda e emocionante. A parte da dança e da gravação foi incrível, estava um dia de vento e frio, mais tudo saiu perfeito. Eu amei participar desse trabalho e fazer parte dele, ficou muito lindo”.

Já a aluna Kálitta descreveu a sensação de fazer parte desse trabalho como algo único. “Trazer esse tema não é só sobre contar uma história, é sobre ter a responsabilidade de dar reconhecimento aos verdadeiros heróis. É uma história emocionante e que precisa ser lembrada, foi um acontecimento realmente muito triste, mas infelizmente foi real. Quando o tema nos foi apresentado achamos algo novo e interessante porque nunca tínhamos escutado falar, e ficamos surpresos pelo fato que foi algo que aconteceu tão perto, mas que também é algo muito pouco lembrado e com pouco conhecimento pelo povo gaúcho”.

ORIGINALMENTE ESTE CONTEÚDO FOI PUBLICADO NO JORNAL IMPRESSO*

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