PEDRAS ALTAS

Pedrasaltenses já se preocupam com possibilidade de extinção de municípios

Governo Federal propõe extinção de municípios com dificuldade de arrecadação e menos de 5 mil habitantes. PEC foi enviada ao Senado e na região, atinge Pedras Altas e Aceguá

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Em Pedras Altas já há uma preocupação com as consequências de uma possível aprovação da PEC Foto: Arquivo TP

A notícia da Proposta de Emenda à Cons­tituição (PEC) do Pacto Federativo enviada na terça-feira (5) pelo go­verno federal ao Senado, que prevê a incorporação em municípios vizinhos, daqueles com menos de 5 mil habitantes e arrecada­ção própria inferior a 10% da receita total, foi recebi­da de forma negativa por gestores dos municípios que se enquadram nestas características.

De cobertura im­pressa do TP, Pedras Al­tas, a Cidade do Castelo, que conta atualmente com 2.200 habitantes segun­do estimativa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), sendo 700 na área urbana e 1.500 moradores na rural, estaria enquadrada na lista de ci­dades extintas.

O secretário espe­cial de Fazenda, Waldery Rodrigues, pela Agência Brasil, explicou que a me­dida poderá afetar até 1.254 municípios no país. A in­corporação valerá a partir de 2025, e caberá a uma lei ordinária definir qual muni­cípio vizinho absorverá a prefeitura deficitária. Uma lei complementar discipli­nará a criação e o desmem­bramento de municípios.

A PEC também es­tende as regras da execução do Orçamento federal aos estados e municípios. A regra de ouro (teto de endi­vidamento público) e o teto de gastos seriam estendidos aos governos locais. As Prefeituras e os governos estaduais também poderão contingenciar parte dos Orçamentos dos Poderes Legislativo, Judiciário e do Ministério Público locais. A PEC também acaba com a disputa judicial em torno da Lei Kandir – ao estender a transferência de royalties e participação especial do petróleo para todos os esta­dos e municípios – e proíbe que estes se apropriem de recursos de fundos de pen­são e depósitos judiciais de ações entre particulares para pagarem despesas.

FAMURS No Rio Grande do Sul, conforme posicio­namento da Federação das Associações dos Municí­pios do Rio Grande do Sul (Famurs), dos 231 muni­cípios gaúchos que têm menos de 5 mil habitantes, 226 têm receita própria menor do que 10% do total da receita municipal, consi­derando apenas o Imposto de Transmissão de Bens Imóveis (ITBI), Imposto Predial e Territorial Urba­no (IPTU), Imposto Sobre Serviços de Qualquer Na­tureza (ISSQN), taxas e contribuições de melhoria. A média de arrecadação própria desses municípios é de 4,8%, ficando foram desta regra apenas os com menos de 5 mil habitantes: Capivari do Sul, Monte Belo do Sul, Coxilha, São João do Polêsine e Aram­baré, que possuem média de arrecadação de 11, 7% do total.

A Famurs chama a atenção para o que governo federal está entendendo como receita própria. “Ou­tras receitas decorrentes de prestação de serviços de máquinas rodoviárias, iluminação pública, tarifas de fornecimento de água entre outros, caso forem consideradas, poderão mo­dificar esse cenário”, diz a nota.

Para o presidente da Federação e prefeito de Palmeira das Missões, Eduardo Freire, “a proposta não representa um pacto fe­derativo justo, que valorize os municípios. O projeto foi construído de cima para baixo, sem ouvir as entida­des representativas.”

PEDRAS ALTAS O pre­feito de Pedras Altas, Be­beto Perdomo (PSB), em entrevista à reportagem do TP via telefone, pois cumpria agenda em Porto Alegre na busca por recur­sos para a manutenção das estradas em razão dos tem­porais registrados na se­mana passada, disse que a notícia da PEC do governo federal gerou sentimentos de perplexidade e indig­nação, não somente com relação a Pedras Altas ou ao Rio Grande do Sul, mas também o funcionalismo brasileiro. “Estamos in­dignados, esse governo ao invés de se preocupar em governar fica procurando pautas polêmicas que não levam a lugar nenhum. Estamos aí com a obra da ERS-608, uma obra há mais de 10 anos e que não sai do papel, prejudicando nosso direito de ir e vir e agora vamos ter que gastar energia, juntamente com os outros municípios, para continuarmos municípios”, manifesta o prefeito.

Perdomo diz não aceitar a PEC, pois cerca de 40% dos municípios deixariam de existir. “Olha na prestação de serviço que esses municípios tem para com suas comunida­des, tanto da área urbana como rural?! Como fica o sentimento dos funcioná­rios públicos municipais concursados, da população que precisa de políticas pú­blicas de governo? Certa­mente vamos buscar apoio da Famurs, ver as ações relativas a esse projeto de desmanche dos municípios pequenos”, enfatiza o ges­tor.

O TP também contatou com o presidente da UTE Ouro Negro, ex­-prefeito de Pedras Altas e presidente da comissão de emancipação do muni­cípio, Silvio Marques, que considerou o assunto por dois ângulos, o econômico e o social. “Considerando simplesmente a questão financeira, a proposta faz sentido, tem lógica. No en­tanto, para as comunidades é um enorme prejuízo. Vol­tar a condição de Distrito é levar essas comunidades ao declínio social e econô­mico. O grande motivador das emancipações era o abandono, o descaso no tratamento dado a essas comunidades pelas admi­nistrações. Direcionado a Pedras Altas como cidade, atualmente há uma grande expectativa de crescimento econômico com a implanta­ção da UTE Ouro Negro e um grande potencial turís­tico em razão do Castelo de Assis Brasil, a silvicultura, a pecuária e a agricultura que estão em franco de­senvolvimento no nosso território”, posiciona-se.

COMUNIDADE O pedra­saltense, professor univer­sitário Magnun Rochel, que reside atualmente em Belo Horizonte, Minas Gerais, mas visita com frequência os familiares na Cidade do Castelo e acompanhou o processo de emancipação da cidade, ao saber da PEC, falou em retrocesso nas redes sociais. Ele contou ter vivido duas realidades, a fase em que Pedras Altas era Distrito de um municí­pio maior e a fase já inde­pendente, emancipada. “Vi as duas realidades: de falta de acesso a simplesmente tudo, e o acesso chegando quando começamos a ter uma estrutura municipal com Prefeitura, Câmara, reformas escolares, atendi­mento rural de saúde, luz, água, remédios e todo apa­rato estatal funcionando no meu município. Sei como é ser visto como distrito rural, onde os políticos só visitam em ano eleitoral e sei como é ter um governo próprio. Pedras Altas, mi­nha cidade, mudou muito desde que nos emancipa­mos. Foram anos de luta para que, em 1999, o gover­nador Olívio Dutra (PT), assinasse o pedido do povo pedrasaltense e, finalmente, nos desse a tão desejada emancipação. O governo Bolsonaro quer agora nos extinguir novamente, nos retroceder à década de 90. Precisamos resistir porque é dever do Estado garantir o bem-estar da sua população e, como pressuposto disso, está a forma como o Estado se coloca para a população, seja ela quantitativamente pequena ou não. Não po­demos deixar que esse re­trocesso brutal aconteça”, manifestou Magnun.

COMÉRCIO O TP con­versou também com o proprietário do supermer­cado Super Pedras, Brau­ner Marques Teixeira, que apesar de não estar claro como ficariam os funcio­nários públicos, falou nas consequências de uma di­minuição de empregos na cidade e o impacto para o comércio local.

Segundo o empre­sário, o município é movi­do também pela área rural, porém 80% dos clientes são funcionários públicos e com a extinção da Prefei­tura, o município iria parar. “A maioria dos empregados são funcionários públicos, além de outras poucas va­gas em comércios. Para nós vai ser um retrocesso muito grande. Por ser um município pequeno, ainda trabalhamos com fichas, vales e o refeisul que é bas­tante utilizado para ajudar nas contas mensais. Sem o salário dos funcionários e o vale-alimentação, a cidade vai parar. Já vivemos uma situação complicada de estrada quase intrafegável, com transportadoras que não querem fazer entregas pelo difícil acesso e se pa­rar de circular esse valor na cidade, muitos estabe­lecimentos vão fechar as portas”, relatou Brauner.

ACEGUÁ Emancipado de Bagé, em 1996, o municí­pio de Aceguá, que tem a frente o prefeito Gerhard Martens (doutor Geraldo), do PSDB, também será ex­tinto se a PEC for aprovada no Congresso Nacional. De acordo com estimativa do IBGE, o município tem 4.901 habitantes.

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