Aí são outros quinhentos

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A expressão “Aí são outros quinhentos” pode ter origem em lei instituída na península Ibérica, por volta do século XIII, que es­tipulava uma multa de 500 soldos a quem ofendesse um nobre. Se ofendesse de novo, teria de pagar outros quinhentos. José Diniz de Moraes, procurador do trabalho do MPT/RN, escreveu uma ver­são que eu simplifiquei. Segundo ele, há quem diga que surgiu no sertão nordestino.

Zé do Egito resolveu deixar o sertão e vendeu seus pertences. Porém, resolveu deixar parte do seu dinheiro no interior. Chamou quatro amigos e foi até a paróquia. Lá, na presença de testemunhas, depo­sitou o dinheiro nas mãos do Vigário. Pouco depois, arrependido, voltou sozinho à casa do Vigário e pediu o dinheiro de volta. Pegou seus 500 contos de réis e no dia seguinte partiu num pau-de-arara para São Paulo. O Vigário não suspeitou do caipira. Nem co­mentou sobre a devolução do dinheiro.

Zé do Egito não se adaptou, voltou.

“Seu Vigário vim buscar meu dinheiro!”, disse sem cerimônia. O Vigário tomou um susto. “Mas que dinheiro, homem, se lhe devolvi no mesmo dia do empenho?”. “Não, seu Padre, o senhor está engana­do. Eu deixei o dinheiro com o senhor e quero agora de volta!”. O Vigário argumentou, mas o homem não arredou pé. A discussão chegou à rua e curiosos queriam saber o que ocorria. Ouvia-se o homem aos berros afirmando e o Vigário negando.

Ocorrência, delegacia, processo, julgamento. O Vigário injuriado, quase falido, não queria pagar de jeito algum. O Bispo intercedeu sem sucesso. A cidade foi assistir o julgamento. O juiz ouviu autor e réu e não houve acordo. As testemunhas de Zé do Egito foram unânimes em afirmar que assistiram o queixoso entregar o dinheiro ao Vigário. As testemu­nhas do Vigário só conseguiram afirmar a boa honra e honestidade do demandado. O Vigário jurava de pés juntos que tinha devolvido o dinheiro. O povo comentava, desconfiado.

Um famoso Coronel, conhecido de todos, compadeceu-se da situação do Vigário e tentou uma saída de mestre. Pediu permissão ao juiz e este acei­tou ouvir o testemunho daquele distinto senhor. Zé do Egito não entendeu nada. O coronel falou: “Senhor Juiz, acho que o Seu Zé do Egito se equivocou. Ele, quando recebeu o dinheiro do Vigário, passou lá em casa e deixou comigo! Está aqui, devolvo”. Todos se entreolharam. O Vigário beijava o chão em agrade­cimento a Deus. O Bispo fazia o sinal da cruz, pela graça. O Juiz começou a falar e foi interrompido por Zé do Egito, que deu um salto da poltrona: “Pera aí, Coronel, não misture as coisas, o problema aqui é entre eu e o Vigário, não se meta nisso. Nosso ne­gócio é outra coisa bem diferente, e, aí, são outros quinhentos!”. Passou a mão no dinheiro oferecido e embolsou. E se desculpou com o Juiz. Este, sem ter o que fazer, bateu o martelo condenando o Vigário que caiu desmaiado, em meio aos gritos da multidão que aplaudia a justiça.

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