PATRIMÔNIO HISTÓRICO

Família de Assis Brasil garante que venda do Castelo de Pedras Altas está em fase final

Bisneta disse que família viu na venda, chance da estrutura receber os devidos cuidados por meio de um único proprietário

Castelo foi inaugurado em 1912 Foto: Arquivo TP

Deve ser finalizado nas próximas semanas o processo de venda de um importante patrimônio histórico e cultural da região, o Castelo de Pedras Altas. Localizado na pequena cidade que ficou conhecida como a “Cidade do Castelo”, o monumento inaugurado em 24 de junho de 1912 foi palco da assinatura do tratado histórico que pôs fim à Revolução de 1923, entre ximangos e maragatos.

A fortaleza idealizada e construída em granito rosado conta com 44 cômodos erguidos em uma área de 300 hectares. O castelo serviu de moradia para o advogado, político, orador, escritor, poeta, prosador, diplomata e estadista gaúcho e brasileiro Francisco de Assis Brasil, que também dá nome ao Parque de Exposições da Expointer, em Esteio, na Região Metropolitana. O local foi construído para presentear a sua amada esposa Lídia Pereira Felício de São Mamede.

Familiares junto ao prefeito Bebeto e membros do TRE durante visitação Foto: Arquivo TP

Em entrevista ao jornal Tribuna do Pampa, advogada e bisneta de Assis Brasil, Suzana de Assis Brasil Mendes, que reside em Porto Alegre, confirmou que fotos foram feitas de todos os objetos do castelo para um inventário dos bens tombados junto ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado do Rio Grande do Sul (Iphae). “Como parte do patrimônio é tombado há uma tramitação jurídica. A venda agora do local vai depender da liberação do inventário. Uma vistoria já está sendo marcada pelo Iphae”, disse Suzana, lembrando do acervo de relíquias alocadas na propriedade como os 22 volumes da enciclopédia de Diderot e D’Alambert, de 1751.

Na foto, castelo ainda em construção Foto: Arquivo Familiar/Especial TP

É importante recordar que as discussões sobre a venda do espaço tomaram corpo nos últimos anos, mesmo sem ser unanimidade entre a família inicialmente, chegando o castelo a ser alvo de negociações na casa dos R$ 8 milhões.

TELHADO E BIBLIOTECA – Nos últimos anos a propriedade sofreu com a ação do tempo, ocasionando além de arrombamentos, invasões e furtos, a deteriorização da estrutura, o que gerou inquérito no Ministério Público. Suzana de Assis Brasil Mendes lembra que houve um esforço da família para que posse cumprido um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) que exigia o reparo no vazamento do telhado. “Toda família foi intimada, mas temos que agradecer ao promotor da Comarca de Pinheiro Machado na época, Adoniram Lemos de Almeida Filho, que foi muito acessível e orientou em tudo que foi preciso”, relatou a bisneta do diplomata, que lembrou que uma das alternativas encontradas para quitar as dívidas e custeio foi o arrendamento da granja para o plantio de soja. A obra foi realizada por uma empresa bageense.

Catalogação das obras da biblioteca do castelo Foto: Divulgação TP

O engenheiro civil responsável pela reforma Rafael Hendler, explicou em detalhes ao jornal na época como foi o andamento da revitalização. Segundo ele, a última vez que o local recebeu algum tipo de reparo foi em 1970 quando ocorreu a construção de um telhado de fibrocimento sobre a laje. Em consulta ao Iphae, a orientação dada foi que se voltasse à originalidade, que era apenas a laje. Assim, foram retiradas as calhas, as telhas e a estrutura metálica que dava suporte ao telhado. Na reforma entregue no ano passado, foi feita uma camada de regularização, sendo aplicado um produto impermeabilizante. Ainda, se fez um contrapiso de areia e cimento com aditivo impermeabilizante e por fim aplicada uma ‘nata’ de cimento para fechar os poros do contrapiso.

Em agosto de 2021, quando a obra do telhado foi entregue, o promotor Adoniran explicou que a legislação brasileira sobre patrimônio histórico é esparsa e escassa, tornando o trabalho ainda mais difícil. Na ocasião ele explicou que uma reunião dos 17 herdeiros ou responsáveis para a assinatura do TAC foi um passo importante na preservação. “Tem muita gente querendo a mesma coisa, se agregando. O MP não impôs nada, apenas ajudamos no consenso familiar para a preservação”, assinalou.

No mesmo período, por iniciativa do presidente do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-RS), desembar¬gador Armínio da Rosa, foi designada uma equipe de arquivistas e historiadores para identificar as obras arquivadas na biblioteca do Castelo da Granja de Pedras Altas, um trabalho supervisionado pelo coordenador de Gestão de Informação do TRE, unidade vinculada a Secretaria Judiciária, Ermes Marcolin. Em torno de 8 mil obras foram catalogadas em duas visitas da equipe. A catalogação ocorreu após a assinatura de um TAC entre a família e o Ministério Público de Pinheiro Machado.

Castelo foi construído por Assis Brasil para a amada Lídia Pereira Felício de São Mamede Foto: Arquivo TP

 

“O castelo vai ganhar vida de novo”, diz bisneta de Assis Brasil

Sentimento de ter se criado e fazer parte da história do lugar irá permanecer entre a família

Bisneta de Francisco Assis Brasil, Suzana (C), junto a mãe e neta de Assis Brasil, Maria Cecília, o primo Luis Francisco – filho de Joaquim Francisco que era neto de Assis Brasil (à esquerda na frente), o ex-secretário de Obras, Leonério Miranda e o prefeito de Pedras Altas, Bebeto Perdomo, durante visita ao castelo em 2019 Foto: Arquivo Familiar/Especial TP

Questionada sobre qual seria a vontade da família acerca do destino da propriedade após a venda, a bisneta de Assis Brasil, Suzana, afirmou que a família buscava um proprietário que pudesse dar o devido cuidado ao local e o abrisse para visitação, podendo transformar até em um museu. “Apareceu um interessado que tem a mesma visão e expectativa que tínhamos que seria abertura para visitação, pois toda a família sempre teve amor pelo local, mas não tinha condições de custear os gastos para manter o castelo”, explicou.

Segundo Suzana, desde a década de 80 o número de herdeiros começou a se multiplicar, tendo, atualmente, moradores em diversas cidades como Porto Alegre, São Gabriel, Cristal, Três de Maio e Pedras Altas, através da prima Lydia de Assis Brasil, que cuidou do castelo durante pelo menos 12 anos da forma que foi possível. “Eram muitos herdeiros e difícil administrar, cada um com suas atividades e em razão disso criamos um condomínio familiar, que é um termo jurídico utilizado para designar um imóvel com vários proprietários em que cada um ajuda com um valor. O grupo SOS Pedras Altas foi a forma que a família encontrou para manter o local. Através do grupo nos comunicávamos, fazíamos votações para tomar decisões. Junto com o primo Luis Francisco eu ia sempre que possível. Também contamos com o apoio da Berenice do seu Glênio, em Pedras Altas, pessoas bastante importantes no processo de cuidado do castelo”, relatou.

Sobre o sentimento com relação a venda do imóvel, ela disse ser a única solução encontrada para que o local possa ser cuidado e preservado como a família gostaria e não tem condições. “Tenho certeza que a maioria tem o mesmo sentimento, mas especificamente no meu caso, sinto uma mistura de tristeza com felicidade. Sempre guardarei memórias de um lugar que eu ia passar as férias de verão, um local que foi construído por meu bisavô para a minha bisavó, com conforto e cultura. Lá nasceu meu avô, são muitas histórias, teremos uma ligação eterna, porém não seremos mais proprietários. O importante agora é ver o castelo tomar vida de novo e esperamos que fique aberto para visitação do público”, expôs Suzana que também usou o espaço para fazer um agradecimento especial ao prefeito de Pedras Altas, Bebeto Perdomo, que sempre procurou resgatar a memória do castelo da forma que lhe era possível em razão da estrutura ser de propriedade privada.

O TP também contatou o prefeito Bebeto Perdomo que disse aguardar com expectativa a venda e posterior reabertura do castelo. “O investidor que está em tratativas de negócio avançado quer reabrir o local e resgatar o legado deixado por Assis Brasil. Para o município será muito importante em razão da importância histórica do local e do significado de Assis Brasil para Pedras Altas, estado e Brasil, além de ser uma oportunidade de alavancar o turismo no município, com geração de emprego, renda e, consequentemente a obra total de pavimentação da ERS-608, garantindo o direito de ir e vir das pessoas para conhecer esta importante obra de arquitetura e patrimônio histórico e cultural do município e estado”, explanou o prefeito.

* Originalmente este conteúdo foi publicado no jornal impresso

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