O mundo em que vivemos e as redes

“Eu queria falar com você, te dizer o que eu sentia, ah Maria, Maria. Eu sei que você está em algum lugar nessas ilhas.”
Iniciei minha crônica copiando a frase de uma música dos Paralamas do Sucesso, resumindo em poucas palavras, a forma mais antiga de comunicação, contato, busca pessoal, da maneira mais primária e singela na face da terra, expressando o desejo de alguém em conversar com outra pessoa na simplicidade do mundo.
Mas o mundo das comunicações hoje não é mais assim. A conjugação entre a inteligência e a digitalização vai achando novos espaços de uso, trazendo para si os interesses econômicos que por vezes se disfarçam de segurança nacional.
Essa conjugação simultaneamente se aprofundou em nome do combate ao crime. Londres, por exemplo, é a capital do vídeo, traduzido em cerca de três mil câmeras espalhadas pela cidade. A autoridade policial faz estimativa que um cidadão chega a ser filmado trezentas vezes por dia, e cada vez de forma mais sofisticada. O sistema se aperfeiçoou de tal modo que já é possível reconhecer um rosto no meio da multidão e até mesmo identificar a silhueta de costas.
Na França a ideia em forma de proposta de lei, a vídeo-vigilância passaria a ser monopólio das forças de segurança nacional, onde as filmagens da ação policial do governo serão proibidas, por poderem “atrapalhar”, ou seja, tudo se saberá, menos o que o Estado faz.
Assim, sob o manto da suposta liberdade individual antes oferecida, surge agora outro rosto implacável de tirania e opressão.
Em Fevereiro de 2011 o presidente Obama convidou para jantar na Casa Branca, as 14 empresas mais poderosas da rede mundial de computadores. A imprensa chegou a denominar o encontro de “jantar dos reis”. No ano seguinte, numa sala de sua campanha eleitoral, vários donos das redes informáticas trataram de dados colhidos dos comentários de internautas espalhados mundo afora nas redes mundiais, de forma a identificar em cada um deles, de forma especial, os indecisos, direcionando para eles, indecisos, mensagens políticas convincentes aos interesses de quem queria o voto daquela parcela do eleitorado através de uma campanha de massa personalizada.
Em tempos mais recentes o mecanismo evoluiu. Assim foi na campanha do Brexit, depois com Trump, e por fim chegou ao Brasil, cujos métodos receberam os requintes da brutalidade, violência e agressão moral, malvadeza e truculência, próprios do temperamento de quem os produzia. É assim que estamos conectados hoje, Big Data, Amazon, Facebook, Google e Microsoft. A disputa comercial pelo 5G, nada tem de livre comércio, muito menos regras de concorrência ou preços. É uma questão de estratégia tendo como aliada a poderosa rede mundial de investigadores, isto sim.
Esta faceta ultramoderna, porém, desconhece os direitos individuais e a intimidade de todos nós. A exploração do medo, que pode ser do terrorismo, dos refugiados ou dos migrantes, deu asas ao velho e clássico discurso de que seria preciso abdicar um pouco da liberdade em troca de um pouco mais de segurança, impondo assim, a tática da vigilância sobre a pretensa liberdade.
A privacidade está morrendo aos poucos, talvez em nome de uma vida melhor, mais segura e menos duvidosa.
Será?
Os tiranos temem o velho por suas memórias, os jovens por sua força e desejo de mudar. Eles temem os trabalhadores organizados, por isso a destruição de seus direitos. Eles temem acima de tudo, os livros, os poemas, o teatro e a cultura em geral, os escritores e os poetas, pois estes espalham o saber.

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