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Candiotense conta experiência como comissária de bordo no Oriente Médio

Cibele Machado completou 10 anos de trabalho numa das maiores companhias aéreas do planeta, a Emirates

Cibele Machado completou 10 anos na profissão Foto: Divulgação TP

Mais de nove mil horas de voo e desembarque em 131 países, sendo 62 com pernoite. Estes são os dados contabilizados por Cibele Machado, candiotense nascida no dia 29 de abril de 1983, na época do Hospital Central de Candiota e residente da Vila Operária, no período em que ela completa 10 anos de serviços prestados como comissária de bordo da Emirates, empresa do Oriente Médio.
Através do aplicativo WhatsApp, Cibele, que também é jornalista formada pela Universidade da Região da Campanha (Urcamp), filha de Renato Rodrigues Machado – que hoje reside em Porto Alegre, e Sirlei Lima Meireles – residente de Bagé, contou ao Tribuna do Pampa sobre experiências e dificuldades vivenciadas durante os 10 anos de empresa e profissão. Ela contou que a profissão como comissária e a troca de país aconteceu pelo sonho de conhecer outros locais, principalmente o Brasil. “Eu era professora de Inglês e fiz o curso de comissária após conhecer a história de um colega professor. Vi na profissão uma oportunidade de acrescentar conhecimento na minha vida, uma bagagem cultural em razão das diferentes culturas. Pesquisei sobre a profissão e me formei na escola de aviação em Porto Alegre. As seleções das companhias aéreas ocorrem em São Paulo, assim como da Emirates. Pelo meu nível de inglês havia sido incentivada e fiz também para a Emirates. Passei na Trip, que hoje é Azul Linhas Aéreas, quando a Emirates me chamou”, contou Cibele.

EM DUBAI – Ao ser solicitada a contar sobre a experiência de troca de país e vivenciar diferentes culturas, ela conta ter sido um começo bastante difícil. “No início achava que não ia conseguir terminar o primeiro contrato de três anos. Era tudo muito diferente, tu morar no Oriente Médio é ame ou odeie. É uma cultura completamente diferente da nossa, a comida, estilo de vida é muito particular. Há muito glamour em torno desta profissão de comissária, mas também há o lado que exige muito física e mentalmente. Achava que não iria aguentar pelo impacto da cultura Islâmica. Até se adaptar e ser considerado normal pra ti as coisas do jeito que funcionam no Oriente Médio leva um tempo. Há muita regra, as leis são muito rígidas. A forma como te veste tem que ter cuidado e até a forma como vai te comportar na rua é diferente”, expôs.
A candiotense também falou sobre a tecnologia foi aliada a sua permanência no Oriente Médio. “A tecnologia era muito diferente há 10 anos. Acompanhei uma evolução que me ajudou a permanecer até hoje em Dubai. Para ter contato direto com a família, estar próxima apesar de longe, até pela diferença de horário, que são 7h a mais. Precisei me adaptar para conversar com as pessoas, até mesmo com relação aos horários dos voos”.
A comissária falou sobre a religião naquele país. “Me assustava muito durante a noite de início com relação a religião Islâmica. As Mesquitas tem a hora da chamada da reza, feita em alto falantes, onde a primeira oração é feita antes do nascer do sol e eu me acordava assustada. Morava perto de uma Mesquita e independente de onde more é impossível não escutar alguma delas. Agora já não me acordo mais”, contou.

ROTINA – Ainda relacionada à adaptação em Dubai e na profissão de comissária, Cibele contou que antes do início da pandemia da Covid-19 o ritmo era muito intenso de trabalho. “No mesmo mês tive escalas para Estados Unidos e Austrália. Exige muito fisicamente, te debilita de vitaminas, proteínas, que precisam ser repostas. Tu não consegue te manter saudável com um ritmo de trabalho com horários totalmente diferentes, viajando para climas diferentes. Nessa rotina, ao menos pra mim, não existe café da manhã, almoço e jantar, é apenas refeição. A hora que eu acordar tomo café, por exemplo, independente do horário. Tu te desapega da rotina das pessoas normais”, explicou.

Vestimenta a bordo nos voos desde o início da pandemia

JORNALISTA E COMISSÁRIA – Cibele disse que, aparentemente, não há nada em comum entre as profissões de jornalista e comissária de bordo, mas que ela vê de uma forma diferente. Ela disse que no jornalismo há uma aquisição de cultura através de histórias relatadas, mas que como comissária está adquirindo uma cultura vivida. “Tu viaja para vários países do mundo, diversas vezes e para várias cidades daquele país. Tu acaba sabendo como as pessoas se comportam, o que elas comem. Como não é uma situação de férias, tu acaba criando uma rotina nesses lugares. Isso é o mais interessante desse trabalho, que me impulsionou a querer continuar voando”, contou.
Quando solicitada a citar alguns momentos e voos marcantes durante os 10 anos de empresa, ela disse ser muito bonito viajar para Paris, Nova Iorque, Roma, com pontos turísticos maravilhosos, mas que há coisas que a marcaram, lugares que acabou conhecendo, que se não fosse a profissão possivelmente nunca iria, como o Iraque. “Um voo pra Bagdá lembro bastante (pensei, olha onde eu to). Os comissários falavam pra sentar ao lado direito para ver o palácio bombardeado do Saddan Hussein. Eu tive muita expectativa, fiquei parada, abismada, maravilhada de ver aquilo com meus próprios olhos. O palácio fica bem próximo ao aeroporto e é algo que se destaca na região pela estrutura. Algo destruído na época que me marcou. Acompanhei o processo de reconstrução, foram cerca de 15 voos”, relatou.
Ela falou sobre voos com personalidades importantes, visto trabalhar há seis anos na primeira classe. “Carregamos família Real, presidentes de Estado, dos países, gente muito importante. Tu acaba convivendo com aquelas pessoas no teu dia a dia. Outro exemplo diferente, mas marcante, é o contato com as celebridades. Tive a Gisele Bündchem como passageira. A pessoa está ali na tua frente, sentada e tu não acredita que está acontecendo. São histórias que tu adquire de uma riqueza enorme pra tua cultura, a profissão de comissário te proporciona experiências difíceis de explicar, que talvez tu nunca fosse viver”, completou.

A FAMÍLIA – Atualmente Cibele mora sozinha nas acomodações da empresa Emirates, em Dubai. O jornal perguntou como era e ainda é a convivência com a família. Ela contou que antes da pandemia conseguia ir no máximo umas duas vezes por ano a Candiota, mas que quando havia oportunidade, a família viajava junto com ela. “Tinham os voos para São Paulo e Rio de Janeiro, combinado com Buenos Aires, multisetor que a gente diz, e quando tinha espaço alguém da minha família ia comigo. Várias vezes eles me encontraram no Rio de Janeiro e viajaram juntos para Buenos Aires. Minha mãe e irmã Patrícia Meireles Machado conseguiram. Meu irmão Gabriel Meireles dos Santos também foi ao meu encontro. Tenho uma tia em São Paulo que morava perto do hotel que ficamos pela empresa que também conseguia me visitar. Ia pra casa no meu aniversário. Consegui trazer vários parentes nas minhas férias, principalmente pai, mãe, irmãos”, contou.
Gremista de coração, ela lembrou de estar no Mundial quando o Grêmio jogou contra o Real Madri, em uma data em que o tio a estava visitando na época. “Me sinto privilegiada em ter conseguido proporcionar para as pessoas da minha família tantas coisas. Não só a vinda para Dubai, mas viajar no mesmo voo e mostrar o que estou vivendo. Como moro aqui acaba sendo mais conveniente vir pra cá, pois não é um lugar muito barato”, destacou.

 

Café com pó de ouro no Palácio de Abu Dhabi

PANDEMIA E FUTURO – Cibele, que se considera um pouco tímida com relação as redes sociais, disse ser importante poder dividir essa experiência. “Me formei em um período em que não era intensa a mídia pela internet. Tive um blog pela Zero Hora e não me adaptei. Não conseguia ter tempo, tinha obrigação de escrever e acabava não vivendo. Resolvi que não era hora, desisti e desde o ano passado com as restrições da pandemia e a redução de voos, voltei a escrever. Estou escrevendo crônicas de viagem sobre os países que já visitei, como coisas engraçadas e histórias. Ainda não decidi o que fazer com o material, estou terminando. Separei os países de pernoite, que foram 62, já escrevi sobre 48, então ainda falta material”, relata.
A candiotense disse que a pandemia a fez refletir também sobre a distância. “Em 2020 ficamos quatro meses sem voos para o Brasil, mesmo que eu quisesse ir não poderia. Era uma sensação que nunca havia sentido. Quando tu está fora, sabe que pode e tem meios de conseguir ir para teu país, mas nesta situação, o horror que todo mundo está vivendo , saber que se acontece alguma coisa não tem como sair daqui, é um baque, pesa a distância”, ressaltou.
Ela também contou que já pensa em deixar a profissão e retornar ao Brasil. “Por uma questão pessoal queria chegar aos 10 anos de empresa, mas meu prazo está vencendo. Estou com uma lesão no ombro esquerdo há alguns anos que incomoda bastante. Já fiz tratamento, mas estou eternamente em fisioterapia. Médicos já me orientaram não ser mais possível seguir com essa rotina. Estou aguardando que essa situação com relação à pandemia melhore. Nos próximos meses devo deixar a profissão para me tratar. Aí acho que vou para a parte do jornalismo, ainda não decidi”, conclui Cibele Machado.

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