SUPERAÇÃO

Deficiente visual de Hulha Negra supera dificuldades e mostra que limitação não é impedimento para realização dos sonhos

Ela ganhou recentemente uma máquina de escrever adaptada

Rosane junto aos pais e irmãos Foto: Divulgação/TP

Apaixonada por música desde muito pequena, Rosane Serpa de Fragas, 32 anos, é um exemplo de que qualquer tipo de limitação não pode ser um impedimento quando o assunto é a realização de sonhos.

Deficiente visual desde o nascimento, atualmente, a moradora do assentamento Santo Antônio, localizado na BR-293, área rural, região conhecida como Corredor da Capivara, em Hulha Negra, dá aulas de música na Associação dos Deficientes Visuais de Bagé, sendo professora regente.
Natural de Nonoai, Rosane se mudou para Hulha Negra com os pais com um ano de idade e hoje é formada em Licenciatura em Música pela Universidade Federal do Pampa (Unipampa), com especialização em canto. Filha de Senira de Fátima Serpa e Osmar dos santos Fraga, é irmã de Rose, Charlene, Rafaela e Rudimar Fragas.

Além de uma história linda de atitudes, incentivos e lutas, ela ficou ainda mais conhecida recentemente na comunidade, após ganhar uma máquina de escrever em braile (sistema de escrita tátil utilizado por pessoas cegas ou com baixa visão), por meio de uma emenda impositiva do vereador Luis Gustavo Dias, o Baixinho, no valor de R$ 8 mil, adquirida através da Secretaria de Assistência Social do município.

Professora de música recebeu a máquina do
vereador Baixinho e da secretária Elisete Brasil Foto: Divulgação/TP

Em entrevista ao Tribuna do Pampa via WhatsApp, Rosane falou sobre a importância da máquina para o seu dia a dia. “Na escola tive o primeiro contato com a máquina de escrever em braile. Meu desejo é continuar trabalhando com partituras e agora tenho máquina em casa, o que vai ser importante, tanto pela questão de eu dar aulas como para as partituras. Gostaria de agradecer ao vereador Baixinho e a equipe da Assistência Social da Hulha por esse presente. Agradecer pela vida deles, que Deus possa auxiliá-los a trabalhar ainda mais”, destacou.

A DEFICIÊNCIA VISUAL – Rosane contou ao jornal já ter nascido com deficiência visual, porém o diagnóstico chegou um pouco mais tarde. “Meus pais contam que na época me levaram para visitar meus avós, ocasião em que meu avô notou que eu ficava cuidando cada coisa que passava, mas sem olhar. Fui levada no oftalmologista e após exames, meu problema de visão foi descoberto. Aparentemente, meu olho é normal, porém com a íris mais dilatada. Mas meu problema é no nervo ótico, uma atrofia no nervo que transmite imagem para o cérebro que não se desenvolveu como deveria”, relatou a professora de música.

SUPERAÇÃO – Ela contou à reportagem ser a única de cinco irmãos com a deficiência, o que a fez iniciar os estudos mais tarde que os irmãos após o auxílio de uma assistente social. “Meus irmãos iam para a escola e a assistente disse aos meus pais que era possível eu estudar. A partir daí, ela fez um encaminhamento para eu estudar na escola estadual Justino Quintana, em Bagé, que possuía classe de recursos com um Centro de Apoio ao Deficiente Visual. Tive quatro professoras (a Regina Mendonça, a Elisa e a Elizabete Dinegri, e a Cristiane) que trabalhavam com ensino de braile. Elas me ensinaram a ler, escrever e a ter contato com objetos e coisas”, relembrou.

Segundo Rosana, inicialmente havia dificuldade com os estudos que se dividiam em escolas convencionais e classes de recursos. “Demorou pra eu aprender o braile porque eu não conseguia identificar as letras e não era incentivada a tocar nas coisas. Mas além do atendimento e acompanhamento da rede de apoio, cursei ensino fundamental e médio completo. Em 2014 entrei na faculdade e em 2015 fiz um curso específico de partituras de braile com flauta doce com uma professora paulista que trabalha no Instituto de Cegos Padre Chico, em São Paulo. Me formei no início de 2020 e ficamos um tempo parados em razão da pandemia de Covid-19”, contou Rosane, que relata ter uma vida normal em tarefas de casa. “Faço as coisas normais, tudo que da pra tocar e sentir”.

Especializada em canto, Rosana contou ao jornal que o seu sonho é trabalhar com partituras apesar de integrar, atualmente, um projeto social. Ao longo de sua trajetória, sempre acompanhada da mãe Senira para deslocamentos a Bagé, visto não ser sua cidade de moradia, ela carrega vários  aprendizados. “Dou aula de músicas especializadas de sambas antigos para o Coral da Associação dos Deficientes Visuais de Bagé. São em torno de 12 alunos com idade superior a 20 anos, onde trabalho com aquecimento vocal e memorização musical, através da aprendizagem de letras. Editamos parte por parte das letras e depois a melodia. Na licenciatura, fiz regência coral 1 e 2. Também fiz aula de canto coral na faculdade e com 15 anos, em 2005, aula no Instituto Municipal de Belas Artes (Imba), onde fui aluna do professor Renato Paim. Também, aula de dança de salão e teatro, além de show de calouros. Desde pequena sempre tive contato com a música. Toco um pouco de violão, o básico, e um pouco de flauta. Tem sido um aprendizado nas aulas e na igreja onde toco e canto”, expôs.

MENSAGEM – Rosane finalizou a entrevista frisando a importância de ser grata a Deus e a tudo que possui. “É um prazer poder compartilhar toda essa história. Graças a Deus estamos aí, o importante é acreditar nas coisas, nos sonhos, realizar e viver a vida que é a melhor coisa que a gente tem. Minha vida é vitoriosa, mas porque Deus está sempre conosco, sem ele e sem as pessoas que nos apoiam não somos nada. Tem pessoas que passam por situações piores, muito ruins, que não podem fazer metade das coisas que eu mesma posso, mesmo que dependa do grau de dificuldade de cada um”, concluiu.

* Originalmente este conteúdo foi publicado no jornal impresso

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