Direito Eleitoral e Segurança Jurídica

A Justiça Eleitoral brasileira possui competências bem definidas, que poderíamos chamar de competências típicas e atípicas. Como competências atípicas, ou seja, aquelas que não são judiciais propriamente ditas, citemos a competência administrativa (administração das eleições), a competência consultiva (resposta de consultas formuladas por autoridades em geral) e a competência regulamentar (expedição de resoluções para dar concretude ao texto de lei). A competência típica, a seu turno, é a competência jurisdicional, no sentido de resolver os conflitos provenientes dos processos eleitorais, abarcando registros de candidatura, propaganda eleitoral e, dentre outros, ações que podem levar à cassação dos registros ou dos diplomas dos players eleitorais. Neste campo, um dos grandes problemas enfrentados pelo Direito em geral é a crescente insegurança jurídica, tanto legislativa quanto jurisprudencial. Ocorre que a segurança jurídica é um direito fundamental inerente à própria noção de Direito. E é aí que se insere, pois, o livro “Direito Eleitoral e Segurança Jurídica”, de Gustavo Boher Paim.
Com apresentação de Rodrigo Lopez Zílio e prefácio de Gabriela Rollemberg, a obra escrita lida com a crise decorrente da falta de segurança jurídica no Direito Eleitoral, o que poderia ser verificado, por exemplo, na ausência de estabilidade legislativa, na ausência de codificação ou, ao menos, de sistematização e consolidação da legislação eleitoral. Já quanto à jurisdição,dentre outras hipóteses, a insegurança jurídica à qual alude o estudo estaria posta nas hipóteses de mudanças abruptas de entendimentos jurisprudenciais, em afronta à confiabilidade do Direito Eleitoral.
O estudo, que é de muita envergadura, parte de um pressuposto demasiado adequado, isto é: diante da insegurança jurídica, tida como cristalina, imprescindível a atuação da doutrina, que precisa cada vez mais se desenvolver, exercendo seu papel questionador e gerador de condutas aptas a permitir que se alcance a segurança jurídica de tão importante matéria. A esse respeito, a obra se insere, com muitos méritos, naquilo que o Professor Lenio Streck chama de “constrangimento epistemológico. Noutras palavras, “a doutrina precisa doutrinar”. E Paim, ao absorver tais premissas, marca um “golaço”.
Ao Direito Eleitoral compete, com seu conjunto de normas, viabilizar que o resultado eleitoral reflita a vontade livre e soberana dos eleitores. Daí que esse ramo do Direito é da essência da democracia, visto que esta pressupõe, minimamente, a realização de eleições livres, periódicas e sem vícios, dimensão que se revela na importância do controle das eleições, o qual tem, em sua vertente contenciosa, papel de imprescindível destaque para o fortalecimento democrático e para a lisura dos pleitos. Contudo, alerta o autor, para que tal objetivo seja desempenhado com a necessária galhardia, são imperiosos a construção e o desenvolvimento de um Direito Eleitoral e de um Direito Processual Eleitoral que viabilize tutelas adequadas, tempestivas e efetivas, aptas a propiciarem a realização do ideal democrático.
Para que se possa falar em um Estado Democrático, não podemos prescindir da realização de eleições periódicas, livres e impermeáveis, tanto quanto possível, a vícios e fraudes eleitorais. Considerando, todavia, que o Direito Eleitoral conforma as regras do jogo democrático-eleitoral, viabilizando o controle jurisdicional das eleições, não é com insegurança que esse caminho deve ser trilhado, sob pena de não se alcançar o próprio ideal de garantia de eleições livres e justas. É por essas e outras, então, que a obra de Gustavo Paim, tal como consta na apresentação escrita por Rodrigo Zílio, é “pedra fundamental do tema (…) na doutrina especializada nacional” e, como consta no prefácio de lavra de Gabriela Rollemberg, “um tijolo para a construção de bases mais sólidas nessa apaixonante área do Direito”. As palavras são merecidas. E a leitura, penso, é obrigatória.

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