*Por Marco Antônio Ballejo Canto
Certa vez, Fernando Henrique Cardoso, num debate para presidente do Brasil, questionou Leonel Brizola dizendo que muitos achavam caros os CIEP, escolas de tempo integral, bandeira primeira de Leonel Brizola. Este respondeu, após afirmar que principalmente os tecnocratas fazendários regateavam (conceder ou dar contra a vontade) recursos para educação, que “Cara mesmo é a ignorância” e continuou “Ignorância entremeada entre as elites. Elites incompetentes que têm levado este país a este quadro”.
Em Porto Alegre, após a enchente de 1941, na década de 60 do século passado, engenheiros e técnicos alemães fizeram um estudo que levou a montagem do sistema de proteção da cidade para uma cota de 6m. Isto significa que se o rio subisse 6m, na ocasião o Guaíba subiu 4,76m, a cidade estaria protegida. O sistema foi implementado, em parte, não exatamente como proposto, creio eu ao analisar os diques do bairro Sarandi.
O Beira Rio foi construído num aterro feito no Guaíba e só não inundaria se fosse protegido por um dique. No início da obra se ignorava a cota 6m estabelecida posteriormente. Foi construído o Parque Marinha do Brasil, a Av. Beira Rio e a contenção do Arroio Dilúvio. O Beira Rio ficou “protegido”. A Arena do Grêmio também não levou em consideração a cota 6m, mas quem projetou não ignorava, ela já existia. O Internacional tem um centro de treinamento e o Grêmio possui três centros de treinamento instalados em áreas do rio sem proteção alguma. Todos inundados.
Não é a primeira vez que a Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul está inundada porque foi construída dentro do rio e os diques do bairro Sarandi falharam de novo.
Porém, nem todo mundo acreditou que o sistema de proteção de Porto Alegre não poderia falhar. Não vi de perto, mas creio que o 1º andar do prédio do Centro Administrativo do Estado não inundou, nem o 1º andar do prédio do Ministério da Fazenda, no centro, nem o prédio da Justiça do Trabalho, no Menino Deus, nem o 1º andar do prédio do IPÊ, na Cidade Baixa.
O sistema falhou. Falhou por falta de manutenção, de equipamentos como geradores de energia próprios, por quadros de comando elétricos colocados abaixo da cota de 6m, por falta de manutenção e ampliação da altura da contenção dos diques do Sarandi, por projetos mal projetados e executados que fizeram estações de bombeamento falharem, entre outros motivos.
Vivemos num país onde virou normalidade uns quantos das elites (e os que não são das elites também) ignorarem o ensinamento científico. Nem têm vergonha de fazer pouco caso destes ensinamentos. Não há como responsabilizar a natureza pela inundação de áreas que deveriam estar protegidas e outras que o rio ocupou em Porto Alegre.
Há séculos que os brancos europeus invasores matam ou expulsam os índios de suas terras ou se misturam com eles deteriorando suas culturas, mas não irão acabar com uma das sabedorias indígenas que diz que “o dono da área que é leito do rio é o rio”.
ORIGINALMENTE ESTE CONTEÚDO FOI PUBLICADO NO JORNAL IMPRESSO*