O verão acabou, mas a estiagem ainda não

* Fernanda Viana

Observa-se que quando o assunto é a água fornecida pelo serviço de abastecimento da Prefeitura de Candiota para o consumo humano, muito se questiona sobre seu tratamento e padrão de potabilidade, sim, é um direito. Mas, quase nenhum questionamento é feito a respeito da escala de desperdício e o mau uso da água potável, por qual motivo?!

Será por que Candiota é uma cidade sem hidrômetro, no qual o usuário paga uma taxa mínima, além de famílias de baixa renda serem isentas ou pagarem taxa social, independentemente do quanto vier a consumir por mês?

Será por que é conveniente usar desculpas como, por exemplo, “é de má qualidade” então só tem serventia pra ser utilizada em lavagens de telhados, muros, grades, fachadas, portas, janelas, calçadas, garagens, áreas externas e veículos em geral com o auxílio de mangueira e/ou lava-jato?

Será por que esse líquido único, finito, insubstituível e comum a todos parece ser inesgotável?

Desperdício é o que vejo todo santo dia e não é de hoje, aliás, não pode ser só eu que vê (aposto que não!), porém acho que anda tão naturalizado que até já se tornou cultural, desse modo não provoca indignação a quem presencia nem sequer constrangimento a quem pratica.

Presumo que deve surgir um pensamento coletivo para ser utilizado como justificativa tipo: se “fulano, beltrano ou sicrano” que trabalha no serviço público municipal, às vezes na própria secretaria responsável, tem o hábito de encher piscina, de lavar veículos com água tratada, etc…, logo isso me dá o direito de também fazer o mesmo.

Diante desses fatos, o foco do meu desabafo junto a uma reflexão não é sobre a qualidade da água e nem sobre a intermitência das frequentes interrupções, pelo menos não agora, embora também seja de grande relevância.

A realidade é que vivemos tempos de estiagem severa, pouca ou nenhuma chuva, barragem muito abaixo do nível normal (como informado pela Prefeitura via Facebook nos dias 7 e 26 de fevereiro de 2020), decreto de situação de emergência na área rural em virtude das consequências da seca, pandemia pelo novo coronavírus, isolamento social para evitar a propagação do vírus (faço um adendo para lembrar sobre um provável consumo extra numa situação onde tem mais pessoas por mais tempo em casa) também é realidade que atualmente mais de 100 famílias do interior do município recebem água por caminhões-pipa.

Particularmente, acho injusto com quem assim como eu armazena água da chuva para fins não potáveis, coleta a água que sai da drenagem do ar condicionado, não faz uso de mangueira muito menos de lava jato, reaproveita a água que sai da máquina de lavar roupas (bem como seleciona os programas econômicos, tais como lavagem com reutilização, eco lavagem e nível baixo) fecha a torneira enquanto escova os dentes, esfrega as mãos ou ensaboa a louça, desliga o chuveiro ao se ensaboar…

Acho não só injusto como também egoísta com quem reside no interior do município, pois lá não há outra opção senão ter de contar cada gota, porque cada gota conta para sobreviverem, para tentar salvar a alface (que muitas vezes vêm parar no prato daquela (e) cidadã (o) que gosta de dizer que come orgânico, mas na hora de limpar o prato não se atina a fechar a torneira enquanto ensaboa-o) além disso, cada gota conta para tentar salvar os animais no campo, a vaca do leite.

O propósito não é causar polêmica, mas sim propor reflexões e sugerir ao governo municipal que haja com mais transparência, especialmente no tocante a esse bem de natureza essencial à vida, finito, insubstituível e comum a todos.

* Por que a instalação de hidrômetros não saiu do papel, já que foi aprovada uma lei municipal pela Câmara em 2018 com essa regulamentação?

* Quem tem acesso a rede social pode ser que tenha lido a informação dada pela página de que a barragem da sede do município, em fevereiro, estava muito abaixo do nível normal, mas e quem não tem acesso?

* Quantos metros abaixo do nível considerado normal está e, qual providências foram tomadas a esse respeito?

* Qual é a situação atual da barragem principal?

* Aonde foi parar a água do lago do caminhodrómo central?

* É com água tratada que empresas diariamente lavam seus caminhões, ônibus, máquinas e equipamentos?

* Por que é permitido o funcionamento de lavanderias e lavagens, isto é, lava-rápido ou lava-jato de veículos em situações como essa, de escassez, a prioridade não deveria ser o consumo humano?

* Por que diante desse cenário de estiagem severa (descrito no parágrafo 5º) não entrou em vigor um decreto municipal a fim de proibir o desperdício e o mau uso da água potável, semelhante ao decreto nº 3788, de 15 de dezembro de 2017?

* A água que vai para o interior do município através de caminhões-pipa sai daqui da cidade? – Se sim, é no mínimo contraditório porque enquanto o campo é abastecido por caminhões-pipa, a cidade deliberadamente desperdiça.

Muitas dessas dúvidas já haviam sido encaminhadas, ao longo dos últimos meses, a página da Pref Candiota, Whatsapp do Adriano Castro dos Santos, bem como do secretário de Obras Artemio, porém ainda sem retorno. Até mesmo denúncias foram realizadas para o 3245-1211, seguindo orientação do respectivo secretário, entretanto descobri que na verdade não existe na devida Secretaria de Obras e Serviços Públicos, um setor encarregado de acolher a denúncia, tampouco verificação nas ruas. Lamentável!

Quanto a nossa parte (minha e do Gabriel Bonini, meu esposo), sim ela vem sendo cumprida diariamente, há anos; e, continuaremos cuidando da água como se a vida dependesse dela. Porque depende.

* Técnica em Segurança do Trabalho, estudante de Letras da Unipampa e moradora de Candiota

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