ENTREVISTA

Segundo Fernando Zancan, Associação do Carvão mudou de nome para ir mais rápido e mais longe

Presidente da entidade concedeu entrevista ao TP esta semana

O presidente da até então Associação Brasileira do Carvão Mineral (ABCM), com sede em Santa Catarina, Fernando Zancan, conversou demoradamente esta semana, por telefone, com o diretor e editor do jornal Tribuna do Pampa, João André Lehr. Na entrevista, Zancan, que estava em Brasília, falou sobre a mudança de nome da ABCM para Associação Brasileira do Carbono Sustentável (ABCS). “É um processo de modernização”, assinalou uma das maiores, senão a maior, autoridade em carvão mineral do Brasil.

Além da troca de nome da associação, Zancan refletiu durante a conversa sobre o momento que a indústria carbonífera e do carbono estão atravessando, falou do futuro, a produção de fertilizantes, transição energética, a transformação de Candiota, entre outros temas interligados.

Tribuna do Pampa – Por que a mudança de nome da entidade?

Fernando Zancan – O que estamos fazendo é colocando um nome que reflete as ações que já estão sendo feitas, ampliando o escopo e buscando mais parceiros para a indústria do carvão. Não sei quem disse isso, mas eu penso que se você quiser ir mais rápido, vá sozinho. Se quiser ir mais longe, vá com mais pessoas. A gente quer as duas coisas, ir rápido e ir longe, e para fazer as duas coisas é manter a agilidade que a entidade tem de um lado e trazer parceiros de outro, sempre procurando ser ágil e responder as demandas. O problema é que nós temos um deadline, uma data, e para conseguir fazer mais coisas precisamos de mais pessoas para ajudar. Agora o nosso seguimento mudou, agora tem investidores na área de geração térmica nacionais e que entendem a necessidade da gente modernizar a indústria  e buscar atuar na economia circular, tanto do carbono quanto dos resíduos, enfim,  temos uma série de desafios e temos que tornar uma associação mais robusta. Isso significa que no momento em que eu abro para carbono, eu não tenho só carvão, tenho outros que possam estar juntos, inclusive o carvão.  Hoje me perguntaram se eu não vou diminuir o espaço do carvão e eu respondo que é o contrário,  estou trazendo comigo parceiros que vão alavancar o carvão,  esse é o objetivo. A ABCS nasce do carvão, é uma continuidade da ABCM. Só que ela está abrindo para trazer mais gente para cuidar do carvão, porque você não consegue fazer uma planta térmica sem olhar a captura do CO2, então tu tem que trazer os ‘caras’ que estão trabalhando com isso. A ABCS não é fruto de uma reinvenção porque é bonitinho e moderno, não  é isso. Nós estamos refletindo no nome agora, o que nós estamos fazendo nos últimos anos.

 

TP – A produção de fertilizantes é parte disso?

Zancan – Sim. Nesta parte de fertilizantes, por exemplo, estamos trabalhando para criar uma indústria a partir do carvão. Tem que trazer as tecnologias e tem gente que quer estar conosco nesta caminhada. É uma forma do carvão se reinventar, e para ele isso acontecer como indústria, é preciso parcerias. Eu posso dizer que o elétron é um subproduto e posso chegar a essa conclusão daqui a uns anos, mas a base é o fertilizante. Uma cadeia produtiva de fertilizantes, que não tem hoje, que pode vir da gaseificação, que é um trabalho que está sendo discutido, como também pode ser da própria usina térmica, que é outro trabalho que estamos fazendo junto com tecnologias chinesas.

 

TP – E a tão falada transição energética?

Zancan – A transição energética tem dois caminhos: fazer uma transição ecológica e tecnológica para o carvão, para ele ser carbono neutro, e do outro lado trabalhar com a transição energética.  Então nós temos que olhar Candiota e as regiões mineiras como um todo, como um local de oportunidade para o carvão e para novos negócios. A Associação vai ser indutora de novos negócios. A transição enérgica é importante para o governo federal e para a nossa indústria e para as pessoas de Candiota. Só que isso tem ser uma coisa organizada e estruturada, tem que ter tempo, dinheiro, criar governança desse processo para que as partes interessadas possam participar. Tem um trabalho enorme para fazer e é um aprendizado, transição energética não é só virar uma chave.

 

TP – E como está a relação com o governo federal?

Zancan – Esta semana estivemos reunidos com os Ministérios da Fazenda e Minas e Energia. Estamos conversando com a Casa Civil, enfim com todos, mostrando e tirando os tabus de cima do carvão. Não tem ideologia nesse aspecto, no momento em que estamos olhando as pessoas, não tem ideologia e todos falam a mesma coisa.

 

TP – Candiota vive uma espécie de revolução. Foi praticamente fundada sob bases estatais, especialmente na área energética, e agora, com exceção da Companhia Riograndense de Mineração (CRM), todas as demais empresas estão sob o controle privado. Como analisa essa situação?

Zancan – Eu não sou contra estatais. Têm estatais muito bem geridas, que dão lucro e que funcionam bem. O problema da estatal é sempre a ingerência política, a cada quatro anos se muda uma gestão e as vezes não tem continuidade de processos.  Mas enfim, o fato de vir agentes privados e que tenham interesse em alavancar a região, como Pampa Sul e Âmbar, são muito bem-vindos. E outra coisa, a agilidade de uma empresa privada é muito grande, com estatal tem lei, tem que licitar e não vem a empresa que é a melhor, mas a que colocou o menor preço, então tem todas as amarras estatais que são ruins para o negócio. Pelo o que eu sei a Âmbar já contratou 47 funcionários novos, então já chegou e já está contratando, está mostrando que não veio com aquele temor de fechar tudo e demitir. Preservou os empregos e contratou mais. Quando eu visitei a Usina (da Âmbar, recentemente) vi o chefe extremamente motivado, falando com orgulho da máquina que estava rodando 350 megawatts. Tu sente orgulho deles que estão ali com aquela empresa para dar retorno para a sociedade e pro acionista. É outra pegada. Acredito que não é papel do Estado cuidar da mineração. Acho que isso é do privado. Possivelmente a CRM vai ser privatizada nesse governo.

 

TP – E o futuro do setor?

Zancan – O setor do carvão deu uma reviravolta, estamos com mais musculatura e com gente que tem uma visão mais ampla e querendo o carvão, porque os outros estavam com outra visão. A Usina de Candiota e Pampa Sul não foram inauguradas, como pode, investimentos de 700 megawatts no RS não serem inaugurados? Estamos com 200 usinas térmicas em construção na Ásia, e nós estamos falando emissão aqui no Brasil? Isso não tem lógica, falta fazer conta. Acho que as pessoas não fazem contas.

ORIGINALMENTE ESTE CONTEÚDO FOI PUBLICADO NO JORNAL IMPRESSO*

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