De Zagalo a Ancelloti

Eu poderia colocar o título partindo de João Saldanha, mas este tinha um estilo explosivo que batia de frente com o regime militar, que impunha ordens ao país desde 1964. Chegando ao final dos anos 1960, Saldanha não interessava ao regime e daí temos a primeira diferença importante. Zagallo e Ancelotti interessavam, cada um no seu tempo.

Com carreiras brilhantes como jogadores, Zagallo assumiu a seleção brasileira na preparação para a copa do mundo de futebol de 1970 como um treinador principiante, enquanto Ancelotti assume como um treinador consagrado. Porém, com a idade que Ancelotti tem hoje, Zagallo também era um treinador consagrado.

O futebol não tem atualmente a dimensão que tinha em 1970. Naquele tempo a música que embalava o país era um hino de auto-ajuda coletiva, coisa de coach (treinador) de seres humanos para que se tornem pessoas bem sucedidas: “Todos juntos vamos, pra frente Brasil, Salve a seleção/ De repente é aquela corrente pra frente/ Parece que todo o Brasil deu a mão/Todos ligados na mesma emoção/ Tudo é um só coração!”

“Zagallo tinha uma constelação de estrelas do meio pra frente. Ancelotti poderá ser campeão do mundo com um time sem identidade nacional se fizer o que todos sabemos que precisa ser feito.”

Em 1970 não se via este hino como uma apologia à ditadura, como hoje alguns querem dizer que foi, e de certa forma foi, mas a juventude de então, por ignorância, alienação ou porque simplesmente simpatizava com a letra, transformou a música e letra num hino nacional.

A seleção brasileira era uma seleção do Brasil com jogadores do Santos, Corinthians, Palmeiras, São Paulo, Portuguesa, Fluminense, Botafogo, Flamengo, Grêmio, Cruzeiro e Atlético Mineiro. Nenhum deles jogava no exterior. Era uma seleção do Brasil identificada com o Brasil. Era a seleção dirigida por Zagallo.

Outros tempos, novos tempos.

O Brasil de 90 milhões em ação é um país com mais de 210 milhões de habitantes e crescemos pouco em número de habitantes. Em 1970 diziam que seríamos muitos mais em 2025.  Por sorte, erraram as previsões.

Com o passar dos anos e a chegada de novas tecnologias, a bola, um instrumento rudimentar, ainda que tenha evoluído muito em qualidade, foi sendo trocada pelo celular e atualmente em cada 10 casas brasileiras podemos encontrar uns 20 celulares e uma ou duas bolas de futebol. Talvez nem tanto. Para cada dez jovens correndo atrás de bola, se encontrarmos um na atualidade é muito.

Sempre ouvi falar que qualidade sai de quantidade. Logo, a qualidade dos atletas, que surge naturalmente, é menor do que se tinha no passado, ainda que com população maior.

Por outro lado, o futebol é jogado com 11 pessoas em cada time e se um time tiver dois ou três jogadores diferenciados é possível fazer um grande time. De preferência que os três joguem do meio pra frente. Se tiver quatro, ganha tudo. Isto faz com que países com populações pequenas possam apresentar notáveis seleções.

Zagallo tinha uma constelação de estrelas do meio pra frente. Ancelotti poderá ser campeão do mundo com um time sem identidade nacional se fizer o que todos sabemos que precisa ser feito. Fecha na defesa e deixa no ataque Rafinha, Pedro e Vinícius Júnior. E reza. É o que temos.

 

JÁ FOI CONTEÚDO NO IMPRESSO

 

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