Como os advogados salvaram o Mundo?

Em 2006 o filme “A felicidade não se compra” (“It’s a Wonderful Life”, no original) foi escolhido pelo American Film Institute como o mais inspirador da história. Dirigido por Frank Capra, a película de 1946 conta uma fábula: na véspera do Natal, um homem, enfrentando enormes dificuldades, está prestes a se suicidar. A vida, para ele, não fazia mais sentido. Sempre procurei ajudar aos outros e nada pedi em troca. Sorri e não fui correspondido. Fui gentil e não recebi o mesmo tratamento. Amei verdadeiramente e me causaram sofrimento. Por que, então, a vida me devolveu tantos dissabores assim, indagava o infeliz? Eu não merecia isso. E não mais viverei, sentenciava. Um anjo aparece, todavia, e faz-lhe uma simples pergunta: como seria a vida das pessoas que aquele homem conhecia sem ele? Se o homem, que pensava em se matar, nunca tivesse existido, o mundo seria outro? O anjo, então, faz o homem ver como seria a vida de uma série de pessoas próximas, caso ele jamais tivesse existido. Fica claro que se tratava de alguém muito importante para todos os que o cercavam. Compreendendo que sua existência fazia sentido, o homem desiste de se matar. Ao contrário, ganha ânimo para enfrentar as tribulações da vida humana. Pois bem. E se os (as) advogados (as) nunca tivessem existido? Como seria ou teria sido o Mundo?
Em “Como os advogados salvaram o Mundo” (Nova Fronteira, 2018) José Roberto de Castro Neves busca demonstrar, não apenas a importância da advocacia para a civilização humana, mas, mais do que isso, como os advogados realmente salvaram o Mundo. E como fizeram isso protegendo o ser humano de seu maior inimigo: o próprio ser humano. O livro do professor Castro Neves faz uma rica viagem por muitos dos mais importantes acontecimentos da história, como a Revolução Protestante, o nascedouro do Iluminismo, a Paz da Vestfália, a Revolução Gloriosa, a Revolução norte-americana e, dentre outros, a Revolução francesa. Personagens dos mais reluzentes na história foram advogados ou tiveram grande afinidade para com o Direito, como Maquiavel, Lutero, Hobbes, Montaigne, Decartes, Locke, Montesquieu, Rousseau, Beccaria, Diderot, Voltaire, Goethe, Jefferson, Madison, Sieyes, Mirabeau, José Bonifácio e Rui Barbosa, todos devidamente citados na obra. E, depois dessa profunda incursão, o autor conclui: sim, os advogados salvaram o Mundo!
Para começar, estabeleceram regras que permitiriam o convívio social. Depois, desenvolveram meios de solução de conflitos, aplicáveis diante dos litígios. Os advogados conceberam princípios fundamentais e os incorporam ao conceito moderno de Estado. Eles organizaram a sociedade. Sem os advogados não haveria democracia. Tampouco as garantias fundamentais do ser humano. Não encontraríamos, sem os advogados, uma série de excelentes ideias que possibilitaram a caminhada da civilização no histórico combate ao despotismo e à tirania. Os direitos considerados “naturais”, como a dignidade, a autodeterminação e o direito de votar, por exemplo, não são históricos. Esses direitos não nasceram no momento em que surgiu a sociedade, mas desabrocharam na era moderna, como uma conquista civilizatória. A sua gênese, a sua explicação, a luta por esses direitos, foi liderada por advogados.
O que há de comum entre episódios tão marcantes na história da humanidade como a Revolução Protestante, a Revolução Gloriosa, a Revolução norte-americana e a Revolução Francesa? A marcante presença de advogados. Entre a codificação romana, a Magna Carta inglesa e a Declaração de Independência dos EUA? Advogados. E entre as peças de Shakespeare e o romance “O sol é para todos”? De novo, os advogados.
Em um Mundo diferente, habitado apenas por seres perfeitos, bons, altruístas, leais, sinceros e pacíficos, os advogados talvez fossem supérfluos. Mas não é esse o Mundo em que vivemos. Se o Reino dos Céus pertence ao Criador, a Terra pertence aos filhos da Luz. E alguém precisa trazer um pouco de ordem ao caos no qual nos metemos desde a nossa expulsão do Paraíso. Sem advogados, o Mundo seria bem pior.
Os (as) advogados (as) não são nada perfeitos, é claro. Eu não sou perfeito, pessoal ou profissionalmente. Somos humanos. Porém, talvez esteja mesmo na imperfeição o residir de uma das características mais belas e marcantes inerentes à advocacia: é como humanos que eles conseguem compreender a humanidade, com todos os seus vícios e virtudes. O advogado é, antes de tudo, um fã do Homem, um humanista. E o seu papel é indispensável.

Comentários do Facebook