Falou demais, talvez

O noticiário dos últimos dias repercutiu uma frase dita por Lula em visita à Etiópia “O que está acontecendo na Faixa Gaza não existe em nenhum outro momento histórico, aliás, existiu quando Hitler resolveu matar os judeus”. Em suas declarações, Lula afirmou que o Brasil condena o Hamas, mas não pode deixar de condenar as ações de Israel em Gaza. A guerra teve início em outubro, quando o Hamas, que governa Gaza, lançou um ataque em Israel que resultou em mais de 1.200 mortes e cerca de 240 reféns, segundo as autoridades israelenses. O número de mortos na Faixa de Gaza resultantes da guerra já passou de 25 mil, segundo o Ministério da Saúde de Gaza.

O palavreado de Lula passa por um conceito errado, mas amplamente difundido no mundo ocidental, o de que Hitler resolveu matar os judeus. Quem queria matar os judeus era o povo alemão que deu amplo apoio para Hitler fazer o serviço. Por outro lado, a frase de Lula foi entendida como uma citação ao holocausto e uma comparação entre holocaustos, o que houve na Alemanha e o que estaria havendo na Faixa de Gaza. Isto é grave porque holocausto é uma palavra que só cabe ao que foi realizado contra os judeus. Nada pode ser comparado. Qualquer comparação será sempre considerada uma ofensa à Israel. Principalmente se alguém tiver a ousadia de dizer que o opressor é o povo de Israel. Lula diz que se referia aos governantes. Não foi por acaso que citou Hitler e não o povo alemão.

A declaração de Lula foi para causar mesmo. Resta saber se a declaração trará proveito ao Brasil. Entrar em atrito com Israel coloca o Brasil em dificuldades diplomáticas com os Estados Unidos e com muitos países do mundo onde Israel possui grandes poderes no governo, com reflexos na economia. Comercialmente, o maior parceiro comercial do Brasil é a China (31,1% das exportações), com os Estados Unidos em terceiro (10,8%), pouco menos que a União Européia (13,6%) e pouco mais que o sudeste asiático (7,2%) formado por Brunei, Camboja, Filipinas, Laos, Malásia, Mianmar, Singapura, Tailândia, Timor-Leste, Vietnã e Indonésia, destaque para Singapura, um dos “tigres” asiáticos. Em quinto o Mercosul (6,9%). E há 30,4% que são as exportações para os demais países.

Em 2022, no final do governo Bolsonaro, que era “amigo” de Israel, o Brasil exportou 7,5 vezes mais para a Liga dos Países Árabes (formada por 22 países do norte da África e Oriente Médio, entre eles Arábia Saudita, Iraque, Líbia, Síria, Marrocos, Egito, Catar e Palestina) que para Israel. Esta relação aumentou nos três primeiros meses do governo Lula quando o Brasil exportou 25 vezes mais para a Liga dos Países Árabes que para Israel.

A fala de Lula na Etiópia deve ficar para a turma do “deixa disso”, diplomatas. Comercialmente pode haver reflexo negativo por pouco tempo com Estados Unidos e União Europeia. Depois o dinheiro fala mais alto. Lula quer mesmo é vender mais para os árabes sem perder os negócios já consolidados. Com Israel, já perdeu quase tudo antes de dizer o que disse e se perder tudo a diferença será inexpressiva.

ORIGINALMENTE ESTE CONTEÚDO FOI PUBLICADO NO JORNAL IMPRESSO*

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