Moysés Vianna

Símbolo de defesa da democracia representativa, da soberania popular e da higidez dos processos eleitorais, eis o que se pode dizer do juiz Moysés Vianna. Nascido em 15 de julho de 1896, no Município de Santana do Livramento-RS, Vianna graduou-se em Direito em 1921, em Porto Alegre, tendo atuado como juiz nas comarcas gaúchas de Encruzilhada e São Jerônimo. Em 1936 o juiz assumiria o posto na cidade de Santiago do Boqueirão, chamada de “terra dos poetas”, onde ficaria por apenas um mês.

Em 1935 ocorreram as primeiras eleições municipais após a criação da Justiça Eleitoral no Brasil. Já escrevemos aqui sobre as razões pelas quais a JE veio à tona na história brasileira, sendo resultado, em verdade, das lutas políticas que compõem a trajetória de um povo. A Justiça Eleitoral surgiu historicamente pela ideia de uma instituição apartada das forças políticas e, portanto, distante e imparcial, incumbida, assim, de administrar os nossos processos eleitorais, da planície ao planalto. Dito de outro modo, tratou-se de uma edificação tendente a quebrar, no âmago das disputas pelo poder, a pecha patrimonialista existente na institucionalidade brasileira. Os resquícios dessa tradição de mando, no entanto, ainda eram muito presentes na década de 1930. E não foi diferente naquelas eleições.

No Município de Santiago a votação em duas urnas acabaria por ser anulada, tudo por conta de erros no preenchimento de alguns documentos por parte de mesários. O erro, então, fulminou o depósito dos votos em duas situações, considerada a inexistência de transparência ou de fidedignidade em ambos. Desse modo, uma eleição suplementar foi convocada para 24 de maio de 1936, apenas para estas duas urnas – que não eram eletrônicas, cumpre lembrar. Os ânimos eram acirrados na localidade, havendo relatos, do próprio juiz ao TRE do RS, de que grupos armados estavam rondando prédios públicos no Município no dia da eleição. Reforço policial havia sido solicitado, inclusive, o que fora prontamente atendido. E a tensão pairava no ar.

Já no término do processo, no entanto, um eleitor tentou colocar duas cédulas votação na urna, o que representaria uma fraude. O juiz Vianna, presenciando o ocorrido, impediu que o eleitor consumasse o seu intento. Ato contínuo, porém, ele seria alvejado por um disparo de arma de fogo. O tiro não o erraria. E daí ele não mais se levantaria. Seguiu-se, e os registros são contundentes, um intenso tiroteio. Quando as coisas arrefeceram, as forças policiais encontrariam o corpo do juiz estirado no chão. Moysés Vianna acabou falecendo no local de votação, justamente ao lado da urna que almejou proteger.

Trata-se, pois, de um exemplo de um cidadão zeloso pela função pública, que acabou entregando a vida em prol da legitimidade do processo eleitoral que administrava na condição de juiz eleitoral. E, para tanto, o magistrado entregou o bem mais valioso que possuía, a sua própria vida. A história, porém, não o esqueceu, tampouco o seu sacrifício em defesa da higidez daquela eleição municipal realizada na Santiago da década de 30 do século passado.

Hoje em dia Moysés Vianna estampa um destacado espaço no Memorial do TRE-RS.Mas não apenas. O seu nome batiza a maior honraria da Justiça Eleitoral gaúcha: a Medalha Moysés Vianna do Mérito Eleitoral do Rio Grande do Sul, instituída em maio de 1990, sob a Presidência do Desembargador Gilberto Niederauer, que já foi entregue a mais de oitenta personalidades de destaque no Direito e no aperfeiçoamento da Justiça Eleitoral, como Paulo Brossard de Souza Pinto e Teori Zavascki.

Dedico, enfim, esta módica coluna, à memória deste grande juiz eleitoral, cidadão de elevado espírito público, o Dr. Moysés Vianna.

ORIGINALMENTE ESTE CONTEÚDO FOI PUBLICADO NO JORNAL IMPRESSO*

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