Não somos tão bacanas assim

Há pessoas que passam por nossas vidas e marcam. Marcam o nosso caminho, a nossa trajetória. Amores e desamores, conselheiros, gente que nos quer bem, e outras nem tanto, enfim, pessoas que vêm e/ou vão, mas que nos marcam de alguma maneira, cada qual a seu modo. O rol é extenso. Todavia, falarei hoje dos professores, afinal, assim também o é com os professores, os mestres que entregam um pouco de si para auxiliar no curso do caminho dos seus pupilos. E escrevei na coluna desta semana sobre um, especialmente: Ricardo Giuliani Neto. Para quem não sabe, Ricardo foi meu professor em uma pós-graduação em Direito Eleitoral que fiz lá em idos de 2012/2013. As suas aulas foram umas das mais marcantes que eu tive o prazer de acompanhar, ainda que por curto espaço de tempo. Depois das aulas, vieram as leituras de seus livros, “Nas Coxias do Poder” e “Imaginário, Poder e Estado”. No mais, a amizade, a camaradagem, os bons papos, também permaneceram. E permanecem intactos. Recebam o texto, agora republicado, como um registro de admiração e respeito e como uma homenagem ao querido professor Ricardo. Pois bem.
Uma coisa é falar de política em tese. É mais fácil, quiçá. Outra, bem distinta, é falar enquanto franco partícipe. É assim que o jornalista Gustavo Machado começa a introduzir o livro “Não somos tão bacanas assim: uma conversa sobre política que precisamos calar” (Dublinense, 2012), de autoria do próprio Gustavo e do professor Ricardo Giuliani, um político progressista e um advogado (dos bons!), além de pintor e escultor. Quando um bom jornalista tem a oportunidade de confrontar um político, não há espaços para meias palavras. Provocado por Gustavo Machado, o professor acaba por revelar os bastidores de um tempo marcado por embates sectarizados e que culminou com uma descrença, quase que generalizada, na classe política. É desse papo, portanto, que nasce a obra citada nesta coluna, uma obra que acaba por expor as entranhas da política do Rio Grande do Sul e do Brasil das ultimas décadas a partir da autoridade de quem viu e viveu de dentro todos aqueles acontecimentos.
A obra é sem rodeios. Não há firulas. Giuliani, o mesmo que gosta de brincar acerca das distâncias abismais existentes entre ele e seu “parente do norte”, o ex-prefeito de Nova York, Rudolph Giuliani, cita nomes, aponta erros – seus e dos outros – propõe caminhos, faz pesadas críticas a ex-companheiros e desfralda francos elogios a adversários. Mas não só. O livro, não raro, carrega tons proféticos. Não em uma, mas em diversas passagens. Querem ver? Citarei aqui a minha preferida. Aspas abertas…
Gustavo pergunta: você conta que sua família era, essencialmente, conservadora, mas que isso não significava conviver com intolerância… Ricardo responde: ao contrário, ser conservador não quer dizer ser intolerante. Ser progressista não quer dizer tolerante. O grande defensor de Luís Carlos Prestes na ditadura Vargas foi um católico conservador chamado Sobral Pinto. A intolerância é uma característica de gente malformada ou mal-intencionada. Isso vale da política à religião. Meu avô paterno era um conservador de carteirinha, mas tinha comunistas como grandes amigos. Meu avô materno, em que pese militar de carreira, era um trabalhista. Então, respondendo: ter parentes conservadores me fez conviver num ambiente de tolerância e, mais do que isso, num ambiente de muita convicção política. Aspas fechadas… Que lição! O livro, caro (a) leitor (a), é de 2012. Que atualidade!
Intolerância realmente não é atributo de progressistas ou conservadores. É atributo de gente arrogante, idiotizada, malformada intelectualmente ou de gente mal-intencionada, seja quanto aos “machões de teclado” ou “moralistas de plantão”, seja quanto àqueles que não acreditam em vida honesta e inteligente fora de determinados espectros político-partidários. Destes, hoje em dia, o espaço público está cheio, à esquerda e à direta. E o resultado? Ah, o resultado está aí. O que é uma consequência, afinal? Ora, consequência é tudo aquilo que vem depois. E ela sempre chega! Ricardo Giuliani Neto já sabia. E acertou. Se a vida ensina, como diz o querido professor, eu sou um aprendiz. E, a partir da leitura das suas obras, obtivemos vários aprendizados. Sempre voltamos à leitura delas. E carregamos conosco o que delas podemos extrair. Convido, então, de maneira muito humilde, o leitor a se juntar, quem sabe, aos conhecimentos e ensinamentos que as obras de Ricardo Giuliani podem fornecer. A começar por “Não somos tão bacanas assim”. Feliz natal e próspero ano novo. Até 2022!

Comentários do Facebook