O Givanildo é um velho amigo de muitos carnavais que conheci no início dos anos 70 do século passado. Uma redundância. Se conheci alguém nos anos 70 só pode ser do século anterior. Rolando Lero, aquele da “Escolinha do professor Raimundo” falaria dele como o Nildinho. Um bom sujeito. Como todos os que viveram a adolescência faz muito tempo, envelheceu. E não gostou, como quase todo mundo não gosta da chamada “melhor idade”. Sexagenário faz uns anos anda resmungando aqui, reclamando ali.
Parece comigo de vez em quando.
Décadas e mais décadas e o Nildinho levando um laço da vida por aqui, um chifre que outro por ali e trocando de mulheres gastadeiras lembra seguidamente uma frase exposta num bar da cidade, “Gastei bem grande parte do meu dinheiro com mulheres e cervejas, o resto gastei mal”.
Porém, o tempo passa, as dores chegam, a energia não é mais a mesma e de tanto levar lambada o Nildinho chegou à conclusão de que é merecido o descanso. Falando com uma guria nova que estava incomodando outro dia se saiu com esta: – Chega!!!! Tu não vês que eu sou um homem cansado…
Indignado com algumas coisas mais decidiu que tem dois objetivos na vida, pagar as contas e morrer. Foi logo avisando que iria se dar, presente de natal, uma cremação. Um dos viventes que ouviu esta história, sabendo que a aposentadoria anda diminuindo ano a ano e que o Nildinho não anda lá com estas coisas de dinheiro no bolso lembrou, “sai caro”.
O homem sempre foi determinado, isto ninguém pode tirar dele. Não se deixou intimidar, “faço um crédito consignado e resolvo a parada”. O Nildinho se aposentou como servidor público; um consignado sempre está na cabeça de um servidor.
Sabendo que o indignado pretendente do além era costumeiro fazedor de “papagaios” de curto prazo, um conhecido chutou o tempo do empréstimo que o Nildinho faria para pagar a cremação, “três meses”. Este, que nunca deixou de lembrar que pretendia morrer sem dever nada para ninguém, estabeleceu:
– Noventa e seis.
(Texto publicado originalmente no blog Recanto da Letras)
