Tradição vs. Modernidade: a luta de um jornal

*Por Guilherme Barcelos

Muito se tem falado acerca da regulação das plataformas sociais, tema que, não raro, vem descambando para o campo das paixões e circunstâncias momentâneas. Nós mesmos já escrevemos aqui acerca dessa polêmica, ocasião na qual procuramos enfatizar o fetiche que o debate brasileiro segue cultuando pelo conteúdo, quando, quiçá, a forma seria o mais relevante. Isto é: fala-se muito acerca de conteúdo de posts, compreendendo-se muito pouco como se dá o funcionamento dessas redes.

Falamos, também, diga-se de passagem, acerca dos perigos dos discursos em defesa da democracia, não que eles sejam um problema em si, mas de como, em nome disso, atrocidades podem ser cometidas, e à rodo. Exemplos históricos não faltam. Já na atualidade temos alguns episódios que nos causam demasiada preocupação: inquéritos semi-eternos, sem objeto definido, com confusão entre investigação, acusação e juiz; medidas de ofício, sem contraditório; suspensão de contas de parlamentares; determinações judiciais sem publicidade e afins. E, registre-se, até mesmo a linguagem utilizada por algumas autoridades judiciais, indicativas de possível quebra de imparcialidade, seja objetiva, seja subjetivamente – qualquer uma das duas seria problema grave.

Pois bem. Há uma questão, entretanto, que, vez ou outra, tem sido esquecida. A conduta das plataformas sociais em face dos seus próprios usuários, não quanto ao funcionamento dos seus algoritmos, ou quanto à formação das chamadas “bolhas”, mas quanto à manutenção das próprias contas. Quantos não devem ser os casos Brasil afora de contas “hackeadas” e de perda de acesso aos perfis por parte de usuários de determinadas redes sociais, sem que estas providenciem o restabelecimento? Conhecemos vários deles.

Eis que o Tribuna do Pampa, isso mesmo, se viu imerso na realidade que expusemos acima. Este periódico teve sua conta no Facebook “hackeadas”, conta que estava sendo utilizada por terceiros. O Tribuna não consegue acessar o perfil, considerando a alteração de dados promovida. Após uma sucessão de contatos com a plataforma, nada foi feito. A conta foi perdida. Porém, voltou a ser utilizada neste ano, a partir da veiculação de conteúdos inadequados, o que traz, desde já, prejuízo à imagem do periódico, que é um veículo de comunicação regional com mais de 55 mil seguidores.

Vejam a gravidade da situação: o jornal sequer mesmo pode bloquear as publicações ou mesmo responder e justificar ao seu público, que pode não distinguir que o conteúdo publicado não se origina do Jornal Tribuna do Pampa. Grave, demasiado grave. Só restou, então, ao TP, a procura do Judiciário. Assim foi feito. E em demanda judicial proposta pelo jornal, patrocinada que foi – e segue sendo – pelo advogado Elton Barcelos, sobreveio decisão liminar determinando, em até 24 horas, que o Facebook restabeleça os dados originais de acesso ao perfil do autor, permitindo seu acesso, até solução final, no prazo de 24 horas, sob pena de fixação de multa diária.

Segundo a decisão proferida pelo juiz Humberto Moglia Dutra, da 1ª Vara Cível de Bagé-RS, foi comprovada a veracidade das alegações através de documentos, boletins de ocorrências, notícias, bem como “prints” de postagens que comprovam o uso do perfil em desacordo com as publicações da página, que publica notícias do jornal Tribuna do Pampa. O perigo de dano é evidente, pois a autora tem a sua imagem associada a publicações inadequadas. Assim foi determinado à rede social, por via de consequência, o restabelecimento dos dados originais, permitindo o acesso à conta, no prazo máximo de até 24 horas, sob pena de imposição de multa diária.

A decisão é adequada. E denota, em seu quadro fático, um problema que muitas pessoas, físicas ou jurídicas, passam semelhantemente. E assim se encontram nessa mesma situação, considerada a negligência das plataformas sociais, no sentido de garantir o acesso e a segurança das contas mantidas por elas próprias, ou em seus espaços.

A ver, ao fim e ao cabo, os próximos capítulos. Na esperança de que o Facebook cumpra a referida decisão judicial. Descumpri-la, pois, além de multa, poderá fazer com que a plataforma incida no crime de desobediência…

ORIGINALMENTE ESTE CONTEÚDO FOI PUBLICADO NO JORNAL IMPRESSO*

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