SEMINÁRIO DE ENERGIA

Carta de Candiota reafirma luta pelo carvão mineral

Redação final da Carta de Candiota foi realizada ao fim do evento

Redação final da Carta de Candiota foi realizada ao fim do evento Foto: Divulgação TP

Candiota sediou nos dias 9 e 10 de abril o 5º Seminário Internacional Energia para o Desenvolvimento. O evento reuniu lideranças políticas, empresariais, sindicais, associações, professores, estudantes, dirigentes de empresas públicas e concessionárias de serviços públicos, que debateram durante dois dias o futuro da produção de energia na região.

Ao fim, o evento produziu a Carta de Candiota (confira íntegra no box), que deverá ser entregue aos governos estadual e federal, bem como, a diversos órgão públicos e privados.

Dentre os compromissos firmados pela Carta está a defesa intransigente do carvão mineral como fonte de produção de energia, desenvolvimento econômico e social e riquezas. Também o documento se coloca contrário a proposta de privatização das estatais gaúchas e também da Eletrobras, além do aprofundamento das tecnologias que reduzam os impactos ambientais.

AVALIAÇÃO – Nesta edição, a organização ficou a cargo da Universidade Federal do Pampa (Unipampa), do Sindicato dos Técnicos Industriais de Nível Médio do RS (Sintec-RS), do Sindicato dos Mineiros de Candiota, da Prefeitura e Câmara de Vereadores. O TP ouviu e colheu a opinião de alguns dos organizadores, que avaliaram o evento.

O Sindicato dos Mineiros, através de sua direção, publicou em sua rede social, um agradecimento a todos os participantes e organizadores, assinalando que foram dois dias de intensa participação de alunos, autoridades e técnicos. “Outro fator que merece ressaltar foi o envolvimento de todos, para que o Seminário fosse coroado de todo o êxito.

A elaboração da Carta de Candiota para a sociedade é importante ferramenta na continuação da luta em defesa do patrimônio público, da evolução tecnológica e ambiental na produção de energia e o papel da energia para o desenvolvimento regional”, destacou.

A presidente da Câmara de Vereadores de Candiota, Andréia Rangel (MDB), assinalou que para o município foi importante sediar o evento. Ela destacou que o desenvolvimento da região passa pelas empresas públicas, mas não deixou de citar os empreendimentos que estão acontecendo pela iniciativa privada, como é o caso da UTE Pampa Sul e a possibilidade do projeto da UTE Ouro Negro. “Além disso, muitos jovens do ensino médio assim como universitários daqui e cidades vizinhas se abasteceram com inúmeros dados e informações. Para os representantes do Poder Público, assim como servidores, o evento serviu como rememoração que a riqueza que possuímos não é só para geração de energia, bem como, é preciso cobrar mais das esferas estadual e federal e trabalhar mais para que realmente o que se constata e se debate em encontros desta natureza saia realmente do papel e salas de debates e se torne realidade”, avalia.

Para o prefeito Adriano dos Santos (PT), o evento serviu, entre outras tantos fatores, para a unificação do discurso em relação ao desenvolvimento regional, sobretudo que a geração de energia, seja ela renovável ou do carvão mineral, é a luta a ser travada. Também, Adriano salienta que o seminário mostrou que o desenvolvimento da região passa pelo fato das lideranças se despirem de vaidades pessoais e se unirem por causas comuns. Com o debate proposto no evento, Adriano avalia que ficou claro a importância da região. “Se de fato houverem os investimentos em nossas potencialidades energéticas, podemos ser a mola propulsora do desenvolvimento não só daqui, mas do Estado”, analisa.

 

CARTA DE CANDIOTA

Os participantes do 5º Seminário Internacional Energia para o Desenvolvimento, realizado nos dias 09 e 10 de abril de 2018 na cidade de Candiota – Rio Grande do Sul, integrado por lideranças políticas, empresariais, sindicais, associações, professores, estudantes, dirigentes de empresas públicas e concessionárias de serviços públicos, vêm manifestar seu apoio às empresas públicas do setor de energia e destacar a importância da exploração racional dos recursos energéticos para o desenvolvimento regional.
Indicam a necessidade de aprofundar os estudos da matriz energética, com a identificação e análise de todas as fontes de energia disponíveis na região, tanto os recursos fósseis, quanto os renováveis. Mesmo as fontes mais abundantes e conhecidas disponíveis na região – carvão mineral e eólico – requerem estudos para melhor qualificá-las e analisá-las.
Embora o carvão mineral brasileiro tenha pouca expressão na matriz energética nacional, no Rio Grande do Sul, e especialmente na região de Candiota, este recurso tem grande importância econômica e social. Das reservas nacionais, estimadas de 32 bilhões de toneladas, 89% encontram-se no estado gaúcho. Apenas a mina de Candiota tem reservas estimadas em 12 bilhões de toneladas, ou 41% do carvão mineral brasileiro, e que apresentam as melhores condições de exploração por sua característica de “mina a céu aberto”, uma condição privilegiada em relação a outras minas no Brasil, especialmente em Santa Catarina, a segunda reserva, com 10% do carvão brasileiro.
No entanto, ainda são necessários estudos para ampliar o conhecimento das jazidas de carvão, com maior quantidade de sondagens que permitam dimensionar de forma mais precisa os atributos geométricos (espessuras, coberturas, extensão em área, encaixantes próximas, padrão estrutural, entre outros cálculos de recursos), bem como atributos físico-químicos, como grau de carbonificação e o grade do carvão. Tais informações são imprescindíveis para estimar as reservas de forma mais precisa, e definir políticas de exploração e o desenvolvimento do carvão mineral na região de maneira mais racional e com menor impacto ao ambiente.
Os participantes do Seminário ao reafirmarem o apoio aos novos projetos de geração de energia elétrica, representados pela UTE Pampa Sul, em fase de construção e previsão de operação em janeiro de 2019; e a UTE OURO NEGRO, habilitada para participar do leilão A-6 previsto para o mês de agosto de 2018, cujas tecnologias das caldeiras e os sistemas de controle ambiental apresentam desempenhos superiores em relação às usinas em operação na região, destacam a necessidade de buscar novas rotas tecnológicas para um melhor aproveitamento do carvão mineral.
Dentre as alternativas discutidas no seminário, destaca-se a tecnologia da gaseificação. Os resultados das pesquisas do Laboratório de Energia e Carboquímica da Unipampa indicaram que o “carvão de Candiota” é passível de ser gaseificado. Tal resultado coincide com a proposta de gaseificação industrial, através de projeto capitaneado pelo Grupo Vamtec com apoio da FINEP, cujo objetivo é converter carvão mineral em metanol e energia, integrado na proposta denominada “Polo Carboquímico de Candiota”.
Rotas com base na tecnologia de gaseificação e conversão do syngas em produtos de maior valor agregado, abre uma nova perspectiva ao carvão mineral de Candiota, que somado aos esforços para integrar uma cadeia produtiva a partir dos resíduos da queima do carvão mineral nas centrais termelétricas, para aproveitamento integral das cinzas do carvão, em especial para adsorção e produção de zeolitas, podem ser o diferencial competitivo do carvão mineral em relação a outras formas de energia primária no sul do Brasil.
Nesse sentido, a manutenção da Companhia Riograndense de Mineração – CRM, como empresa pública e comprometida com o desenvolvimento regional é fundamental. Chega a ser irresponsabilidade do governo gaúcho, abrir mão de uma empresa, que mesmo no quadro atual, tendo como principal cliente a Eletrobrás em Candiota é superavitária, com receitas de mais de R$ 50 milhões ao ano, que poderá ser multiplicada com o projeto da UTE OURO NEGRO, em fase adiantada. Bem como todo o potencial do Pólo Carboquímico de Candiota, cuja participação da CRM é condição si ne qua non para a alavancagem do projeto. Portanto, é inaceitável abrir mão de uma empresa estratégica como a CRM, detentora de umas das maiores jazidas de carvão mineral do Brasil. Vale destacar que a empresa detém 1,6 bilhões de toneladas em reservas de carvão provadas e certificadas, transformando-se em um importante ativo para alavancar projetos de desenvolvimento que podem ser decisivos para a metade sul do Rio Grande do Sul.
Tão grave, é a insistência infundada do governo gaúcho em levar a cabo um processo de privatização das empresas públicas que são fundamentais para o desenvolvimento do Rio Grande do Sul, como a CEEE, Sulgás e CRM, bem como a extinções das fundações e institutos de pesquisas, como CIENTEC e FEE. Nenhuma sociedade que almeja um futuro abre mão da pesquisa e do desenvolvimento tecnológico.
A Companhia Estadual de Energia Elétrica – CEEE, também uma empresa superavitária, que apresenta indicadores de desempenho surpreendente nesse quadro de desmonte do patrimônio público, sendo considerada a quarta melhor empresa de distribuição de energia elétrica em todo o Brasil, e a primeira em fidelização de cliente, demonstrando o valor e o compromisso de seus funcionários com o interesse público. O mais grave, que beira a irresponsabilidade, é a insistência da privatização sem qualquer lógica econômica ou de desempenho, justificada apenas em ideologias rejeitadas em diversos países, que vê na privatização um fim em si mesmo.
Já a Companhia de Gás do Rio Grande do Sul – SULGÁS tem desempenhado importante papel no suprimento energético para indústrias e residências, é considerada a segunda estatal mais rentável do Brasil. Embora tenha sua atuação predominante na região metropolitana e nas cidades industriais gaúchas, os participantes do seminário consideram a empresa estratégica para o desenvolvimento da metade sul, sobretudo, quando se reafirma a rota tecnológica da gaseificação.
A experiência brasileira com as privatizações, especialmente do setor elétrico, trouxeram consequências negativas até hoje sentidas pela sociedade brasileira. Por exemplo, o aumento das tarifas de energia elétrica verificado no período, colocou o Brasil na quarta posição entre as mais caras do mundo. Caso seja levada a cabo a proposta de privatização da Eletrobrás, tende a agravar este quadro, diminuindo ainda mais a competitividade nacional.
A experiência internacional demonstra que nenhum país abriu mão do controle de seus reservatórios, tendo-os como estratégico, sobretudo, se considerarmos a importância da geração hidrelétrica no Brasil e o uso múltiplo dos recursos hídricos. Portanto, refirmamos a importância do sistema Eletrobrás, e em especial o papel da CGTEE em nossa região.
Defendemos um caminho inverso ao proposto pelos governos federal e gaúcho. Entendemos que é fundamental o resgate das empresas públicas, não só com a manutenção dos projetos em andamento, mas, sobretudo, com a ampliação de sua atuação. Os recursos humanos e a capacidade técnica da CGTEE credenciam-na a tomar uma postura propositiva na elaboração de novos projetos tecnologicamente avançados, e como isso se transformar em um ator ativo nos leilões de energia nova.
Em relação aos recursos eólicos, o processo segue a mesma lógica, ou seja, identificar o potencial disponível. Porem, para o aproveitamento o desafio é muito maior, dado a forma como o recurso (ventos) está distribuído no espaço da região da Campanha e metade sul e, ainda, pela necessidade de aprofundar os estudos com a instalação de torres anemométricas, especialmente nas áreas mais promissoras, de forma gerar informações cada vez mais precisas e que seja um diferencial da região para atrair investimentos em parques eólicos. É evidente que a isso, soma-se a necessidade de formar recursos humanos e ampliar a pesquisa científica na região, a fim de dar o suporte necessário para a indústria de energia eólica, disponibilizando informações cada vez mais confiáveis. Daí a necessidade de formatar programa de desenvolvimento da indústria eólica para a região. Nesse aspecto em particular, a universidade e as demais instituições de pesquisa poderão dar uma contribuição importante nos estudos de modelos matemáticos para melhor compreender a dinâmica da atmosfera e melhor avaliação da disponibilidade e do recurso energético eólico e sua gestão, inserido no contexto do sistema integrado nacional – SIN.
Além disso, é necessário estudar as demais fontes renováveis, como resíduos agrícolas (a casca de arroz, em especial, apresenta um potencial considerável), além de micros e pequenos aproveitamentos hidrelétricos. Nesse aspecto, existe um potencial constituído pelas centrais desativadas, construídas nas décadas de 1960/70 e que podem ser estudadas à luz das tecnologias disponíveis (equipamentos hidromecânicos mais eficientes), podendo ter suas capacidades de produção de energia elevadas, sem que haja impactos ambientais adicionais. Também, devem ser estudas outras possibilidades, como a geração de energia elétrica nas barragens da região destinadas à irrigação, por exemplo.
É fundamental pensar o desenvolvimento dos recursos energéticos articulado com as ações de integração energética Brasil-Uruguai já em curso, como o sistema de transmissão já em operação e o fluxo de energia nos dois sentidos, conferindo maior segurança energética na região, além de abrir perspectivas de mercado demandante de energia. Não é demais lembrar que o grande potencial eólico da metade sul se estende até o país vizinho, e que a exploração conjunta deste potencial – Brasil e Uruguai – pode decorrer sinergias positivas, inclusive relacionadas à produção de equipamentos para atender à demanda da indústria eólica em toda a região. Mais do que a implantação dos parques eólicos, é fundamental atrair indústrias do setor para produzir equipamentos eólicos. Não faz muito sentido os equipamentos serem importados do centro ou do nordeste do Brasil, percorrendo distâncias enormes e com isso impactando nos custos. Temos totais de condições de abrigar indústrias que produzam parte ou a totalidade dos equipamentos.
Tal iniciativa demonstra certa consistência, uma vez há uma nítida orientação governamental em ampliar a participação de fontes renováveis (não hidráulica) na matriz energética nacional, de maneira que a região sul do Brasil poderá abrigar parte substancial dos parques eólicos do Brasil e, portanto, ser um grande demandante de equipamentos e tecnologias do setor.
Para finalizar, não podemos deixar de externar nossas preocupações com os rumos das políticas educacionais e de ciência e tecnologia levadas a cabo pelos governos estadual e federal. Não aceitamos o desmonte da educação pública; não aceitamos o fechamento de escolas; não aceitamos o fechamento dos institutos tecnológicos, nem o estrangulamento financeiro das universidades. Pela autonomia universitária.

Candiota-RS, 10 de abril de 2018

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