DO RJ PARA O RS

Antônio Laffayete: 42 anos de medicina e atenção especial com os pacientes

Bisneto de Gaspar Silveira Martins reside há cerca de três anos em Candiota e possui fortes laços com a região

Médico atende no interior de Candiota Foto: Divulgação TP

Atenção, bom atendimento, tempo dedicado. Quem não deseja receber qualquer destas características ao ter contato com uma pessoa, principalmente em um momento difícil relacionado a saúde? Todas as pessoas! Com base nisso, o Tribuna do Pampa conta mais uma história, a do médico Antônio Lafayette Rodrigues Pereira, conhecido por clinicar primando por estas características básicas.

Há cerca de três anos, doutor Lafayette, como é chamado, faz parte da rede do Sistema Único de Saúde (SUS) de Candiota, com atendimentos nos assentamentos e para pacientes de todas as faixas etárias. Ele é lembrado também, por residir no município, fato incomum na região.

Formado pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (URJ), em 1972, o médico de 72 anos já contabiliza 42 anos de atividades médicas ininterruptas. Por 37 anos foi médico do Ministério da Saúde até a aposentadoria e contabiliza cinco pós-graduações, em Saúde da Família, Medicina do Trabalho e Administração Hospitalar, além de um curso de um ano de eletrocardiografia com o professor Ernesto Carneiro (conhecido pela expressão “meu nome é Eneias”). Também é membro do American Institute of Ultrasound in Medicine e recebeu o título de Cidadão Honorário do Estado de Nebraska – Estados Unidos da América.

Divorciado e pai de três filhos, diz ter encontrado o grande amor do final da sua vida em uma gaúcha de Bagé, com quem tem sentimentos profundos de amor, identidade e planos de casamento para o futuro.

CHEGADA EM CANDIOTA – Natural do Rio de Janeiro, Antônio Lafayette contar ter fortes laços com a história gaúcha, mas principalmente bageense. Ele contou a reportagem do TP, que a vinda para o Rio Grande do Sul e, especificamente Candiota, começou de forma indireta em 1969, quando seu pai viajou até Bagé para conhecer o túmulo de Gaspar Silveira Martins, bisavô de Lafayette. Nascido em 1835, em Cerro Largo, Uruguai, Gaspar é marcado na história pelo fato conhecido como Cerco de Bagé e a Revolução Federalista, inclusive dando nome a praça, rua e escola.

“Na época eu era estudante de medicina e residia no RJ. Meu pai voltou e me contou que o corpo do meu bisavô estava embalsamado na Catedral de São Sebastião, intacto, inclusive com a barba, que ele havia visto quando solicitou a abertura do caixão, localizado na torre direita da igreja. O local havia sido escolhido por também abrigar o mausoléu da família. Ele disse que quando eu fosse a Bagé, falasse com o padre e pedisse para ver. Fiquei com a história na cabeça durante muito tempo e em 2013 vim a Bagé, fui à catedral e verifiquei que tinha uma laje no local, pois o povo estava mexendo muito com aquela história. Fiz amizade com um historiador de Bagé, Cássio Gomes Lopes e até hoje tentamos abrir aquela urna. Providencias estão sendo tomadas junto à igreja”, conta o médico.

A vinda, de fato, para o sul do Brasil e Candiota ocorreu em 2018, após receber convite do amigo Cássio e de primos, entre eles, o bisneto de Francisco Carlos Silveira Martins, irmão de Gaspar Silveira Martins, Roberto Silveira Bandeira, que na época era presidente do Clube Comercial de Bagé.

Com relação à Capital Nacional do Carvão, ele foi enfático. “Me apresentaram o secretário de Saúde de Candiota, gostei da possibilidade profissional de vir. Fechei tudo que estava fazendo em Minas e me mudei. Estou feliz da vida, tinha uma motivação também, que era o amor da minha vida e encontrar a paz que ela me traz. Não pretendo ir embora da região. Minha última morada pretendo que seja Candiota ou Bagé. Sou feliz nessa região como nunca fui. No Rio de Janeiro fui assaltado quatro vezes a mão armada, tendo que entregar bens”, afirma o médico, contando que “ainda faz parte de meu projeto a reabertura do túmulo do meu bisavô, que além de dar nome a praça, teve inauguração de uma estátua, onde meu pai, na época com 66 anos, participou do evento, na ocasião, feita pelo presidente Médici”.

PROFISSÃO EM CANDIOTA – O TP solicitou ao doutor Lafayette, a destacar momentos marcantes do exercício da profissão em Candiota. Ele relembrou um momento divulgado na época pelo jornal, ocorrido no posto do Oito de Agosto, há cerca de 25km da cidade. “Estávamos atendendo e faltou luz, ficou totalmente escuro o ambiente. Uma das minhas enfermeiras, a Jussara, profissional de altíssimo gabarito e que sem ela meu trabalho reduziria a 50%, entrou na sala, ligou a lanterna do celular dela e ficou iluminando a documentação para que eu pudesse continuar atendendo o paciente sem ter que interromper”, conta.

Uma das lembranças de Lafayette durante os atendimentos em Candiota, foi publicada na ocasião pelo jornal Foto: Arquivo TP

Ele afirma gostar de atender a todos. “Não exerço uma especialidade. Tenho uma paciente de 101 anos de idade, uma senhora cega e hipertensa, mas que caminha sozinha sem uso de bengala, ouve bem, está muito lúcida; e atendo crianças, atendi uma menina de 6 dias. Atendo inclusive área de psiquiatria e estar com esse povo é uma paixão”, ressaltou o médico, que sobre a vida pessoal, diz adorar uma leitura. “Nunca vão me encontrar em bar tomando cerveja, só se for um sósia. Minha vida é exercer e estudar a medicina, ler, minha coleção de cerca de 1.100 filmes em DVD, todos originais. Amo cinema, teatro, ballet, leitura e minha futura esposa”, expõe.

Ainda com relação à cidade, Lafayette diz ter escolhido Candiota para morar pelo amor à medicina que ele exerce na cidade, por amor as pessoas, por amor a mulher que encontrou para viver ao seu lado. “Daqui só saio para o cemitério, ou daqui (Candiota), ou de Bagé”.

A MEDICINA – O doutor Lafayette dos candiotenses diz que, com relação à medicina, se sente como se estivesse encontrando com Deus todos os dias e é uma forma de praticar o amor que sente pelo próximo. “Meu pai, quando eu tinha 9 anos, queria que eu fosse engenheiro e eu disse que não, que detestava matemática, que iria ser médico cirurgião geral. Gosto tanto da medicina que mesmo após e aposentar do Ministério da Saúde continuei trabalhando. Hoje, minha meta, aos 72, é trabalhar até o dia da minha morte. Meu pai trabalhou até morrer, com 91 anos e tinha atendido um paciente na véspera. A medicina, para quem gosta, é algo que funciona como um vício, uma cachaça, não consegue largar mais”, manifesta.

LEGADO – Quando o jornal perguntou de que forma o médico Antônio Lafayette pretende deixar seu legado à comunidade, ele diz que é ter a certeza de que as pessoas receberam carinho. Segundo ele, um dos maiores problemas da relação médico-paciente é a distância psicológica que os próprios médicos impõem aos pacientes por não gostarem se aproximar, sendo conhecidos como médicos do estetoscópio longo.

Lafayette conta agir de forma diferente, inclusive para tratar o paciente e citou um exemplo: “Há cerca de um mês entrou um homem de 57 anos com crise hipertensiva no consultório. Na ocasião, ele disse que nunca teve antes o problema e não sabia o que estava acontecendo. Ao invés de entrar diretamente com a medicação hipertensiva, comecei a conversar e descobri que ele não dormia mais à noite. Ele acordava por volta de 4h da manhã e não dormia mais até às 6h, hora de ir para o trabalho, tenso, angustiado, preocupado. Falei com ele que antes e cuidar da pressão, iria cuidar do sono dele. Prescrevi um medicamento e pedi pra ele voltar daí uma semana. Quando ele retornou, estava com a pressão boa e disse que se sentia e dormia bem. Se eu não me preocupo com o paciente e não deixo ele abrir o coração, não terei o mesmo resultado. Escuto muitas queixas de pacientes com relação aos médicos, mas quando eu não estiver mais aqui, quero saber que meus pacientes dizem que eu era diferente. Meu legado é ter a certeza de que o povo recebeu carinho, coisa que os médicos em geral não dão”, expôs.

FAMÍLIA HISTÓRICA – Antônio Lafayette Rodrigues Pereira é bisneto de Gaspar Silveira Martins – advogado e político que iniciou sua vida pública como juiz municipal no Rio de Janeiro, de 1858 a 1859. Depois, foi deputado (provincial e geral), senador, ministro da Fazenda, presidente da Província do Rio Grande do Sul e também conselheiro de estado.

Com palavras escritas pelo médico, segue alguns relatos da história e de seus antepassados. “O Conselheiro Gaspar Silveira Martins, meu bisavô, pai da minha avó Gasparina, tinha um cunhado chamado Lafayette Lopes Pereira, daí meu nome. Ele foi um senador do império por Minas Gerais, Gaspar pelo RS e Lafayette por MG. Eles eram do mesmo ano, Lafayette nasceu em março de 1834 e Gaspar em agosto de 1834. O detalhe curioso, é que os dois namoraram e se casaram com duas irmãs. A esposa do Gaspar, Adelaide, era irmã da esposa de Lafayette, Francisca. Então meus dois bisavôs eram casados com duas irmãs. Eles eram cunhados entre si, amigos do parlamento, eram monarquistas – serviram a Dom Pedro II. Lafayette foi Ministro da Justiça do Brasil no Segundo Império e o Gaspar, entre outros, Ministro da Fazenda, Relações Exteriores. Meu pai me contava que Gaspar no parlamento, se referia ao RS dizendo: ‘Para mim, em primeiro lugar, os interesses do RS, o Brasil vem depois’. Meu trisavô era Carlos Silveira, estancieiro de Aceguá no final do século 18 e sua esposa, minha trisavó, Maria Joaquina das Dores Martins”.

Mesclando história e vida particular, Antônio Lafyette conta mais. “Em janeiro de 2021 estamos (minha amada e eu) com viagem programada para a Cidade Maravilhosa, além de Petrópolis – onde meu pai nasceu e se casou na Catedral onde estão sepultados a Princesa Isabel, seu marido (Conde D’Eu), o Imperador Pedro II e a Imperatriz Teresa Cristina. No Museu Imperial encontra-se o relógio de bolso e corrente, tudo em ouro, que Gaspar Silveira Martins recebeu de presente em 1879, e que eu doei ao Museu em 2007. Em 1958, eu, com meu pai, mãe e irmãos, almoçamos com o príncipe Herdeiro Dom Pedro de Alcântara de Orleáns, neto da Princesa Isabel. Papai era médico de Dona Esperanza, nascida na Espanha e esposa do príncipe. O almoço foi na grande varanda do Palácio Grão Pará”.

Comentários do Facebook