Clássicos que não podem faltar na sua biblioteca

Friedrich Nietzsche (1844-1900), o filósofo prussiano, escreveu que a intimidade com os clássicos nos deixa céticos. E, todavia, que essa aproximação íntima com os clássicos seria o único caminho de salvação para a miserável educação moderna. Mas, no universo da escrita, o que caracteriza um clássico? Muito já se falou acerca disso, a partir de diversos estilos. Não quero falar aqui, a ressalva é importante ,do “classicismo”, movimento que despontou na Europa do período do Renascimento, como que a resgatar a cultura greco-romana, fator que, aliás, compôs parcela deste movimento ruptural para com a Idade Média. A pergunta é: o que torna um livro uma obra clássica?
O Dicionário Houaiss de Língua Portuguesa apresenta o clássico como aquele que serve de modelo, que é exemplar. Mark Twain (1835-1910), por sua vez, com a sua ironia característica, definiu um clássico literário como aquilo “que todos gostariam de ter lido, mas ninguém quer ler”. Já Ítalo Calvino (1923-1985), dedicando uma obra inteira ao assunto, apresentou uma série de justificativas a indicar um clássico, tais como, p. ex.: a) os clássicos são aqueles livros sobre os quais você costuma ouvir pessoas dizendo “estou relendo”, nunca “estou lendo”; b) um clássico é um livro em que a cada releitura oferece uma sensação de descoberta e; c) um clássico é um livro que nunca esgota tudo o que tem a dizer a seus leitores. As definições são instigantes e, por si sós, já fazem pensar muito. Prefiro, ao invés da definição, um alerta. E é de Norman Mailer (1923-2007) que falo, autor segundo o qual “se perdermos o passado, perderemos muito mais do que jamais poderemos imaginar”. Um clássico, assim, seria, talvez, aquela obra que, do passado, vem para iluminar o presente. Clássico é o livro que é sempre atual.
Em “50 clássicos que não podem falar na sua biblioteca”, Jane Gleeson-White investiga nosso passado literário para redescobrir os grandes livros que nos emocionam e nos inspiram, desmistificar a aura muitas vezes assustadora criada ao redor deles e entender por que causam tanta repercussão ainda hoje em nossa cultura ocidental. O resultado do livro de White é uma celebração das maiores obras literárias da história, desde a Ilíada e a Odisseia, de Homero, passando por clássicos da língua portuguesa, até chegar a livros contemporâneos de grandes escritores europeus, latinos e norte-americanos.
Além de tecer comentários sobre o enredo e as personagens de cada obra listada, a autora contextualiza cada título no momento histórico em que foi escrito e fornece dados biográficos do autor, instigando nossa leitura e revelando as razões pelas quais estes livros, os cinquenta citados por ela, têm sido tão apreciados – cultuados mesmo – ao longo do tempo.
O livro “50 clássicos…” reapresenta três epopeias que marcaram o início da tradição literária do Ocidente – as duas de Homero, incluindo a “Eneida”, de Virgílio, juntamente com diversos romances clássicos considerados parte do cânone, tais como “Dom Quixote”, de Cervantes, “Guerra e Paz”, de Tolstoi, “A casa soturna”, de Dickens, “Moby Dick”, de Melville, e “Madame Bovary”, de Flaubert. De igual forma, a autora aborda outros romances que, mais recentemente, passaram a ser considerados como clássicos, como “O apanhador no campo de centeio”, de J. D. Salinger, e “On the Road”, de Jack Kerouac.
Por considerar cada obra como uma entidade viva, que se transforma ao longo do tempo conforme mudam os leitores, e uma vez que são escritas em um determinado período histórico, a autora situa cada livro na época de sua concepção e cada autor em seu momento histórico. Ela inclui detalhes da vida de cada autor e as suas batalhas contra a pobreza, solidão, a guerra, as mágoas, o desespero e a alienação, às vezes até a loucura, tudo para continuar escrevendo. E isso, no fim das contas, humaniza o criador, sobretudo porque, não raro, conhecemos apenas a criatura, além de tornar o livro agradável e, quiçá, até mesmo inspirador.
O fato é que todos temos nossos clássicos favoritos. Um clássico deve estabelecer uma relação pessoal com o leitor, sendo que a atração, longe de ser por obrigação, é por admiração. Jane Gleeson-White apresentou os seus prediletos. E, com isso, considerando que a admiração genuína pressupõe conhecimento, brindou a comunidade leitora com um guia acessível e intelectualmente caloroso sobre os grandes livros do passado, o que é de grande valia para aqueles que cultuam essa prática construtiva – a leitura.

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