Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e Eleições

A era contemporânea é a era da tecnologia. Vivemos numa “sociedade em rede”, como escreveram Jan Van Dijck e Manuel Castells. O fenômeno, como advertiram os mesmos autores, poderia ser conceituado como “revolução digital”. Ou, para outros, como “Indústria 4.0” ou “Quarta Revolução Industrial”, tal como descrito por Klaus Schwab. A questão é que o Mundo de hoje, marcado por uma hiperexposição às informações, se encontra na “nuvem” e, para além, já se fala em metaverso ou, grosso modo, em um mundo virtual paralelo que busca replicar a realidade concreta a partir de dispositivos digitais. O avanço, sem adentrar ao mérito de saber se tudo isso é proveitoso ou não, é evidente.
Esse caminhar crescente da tecnologia vem influenciando os mais diversos ramos da vida em sociedade, incluindo-se aí as próprias formas de participação política e o modo de conduzir as campanhas eleitorais, cujas posturas e estratégias já são sentidas como muito distintas daqueles modos tradicionais de se apresentar ao eleitorado. Vez mais as campanhas estão migrando das ruas para as plataformas digitais, com todos os efeitos – saudáveis? – que isso pode ocasionar, considerados os novos meios de comunicação e, dizem muitos, os novos modos de se fazer política. Não seria distinto quanto ao legislador.
O avanço torrencial se impõe. E as preocupações surgem. Inclusive quanto à preservação dos direitos dos indivíduos, cada vez mais expostos a toda e qualquer sorte de interferências, perigo que aumenta quando o algoz pode ser uma plataforma privada, de feição multinacional, poderosíssima economicamente, e que praticamente não presta contas acerca das suas atuações – os escândalos do Brexit e da Cambridge Analytica estão aí para comprovar o alerta.
A Emenda Constitucional nº 115/2022 recentemente alterou o texto constitucional para incluir a proteção de dados pessoais entre os direitos e garantias fundamentais, além de ter fixado a competência privativa da União para legislar sobre o tema. E a legislação federal veio logo em seguida, marco legal conhecido como Lei Geral de Proteção de Dados (LPGD). A lei, dando concretude ao texto constitucional, não demanda apenas uma postura passiva quanto à não interferência no direito fundamental em comento, mas uma postura ativa, no sentido de exigir readequações várias e variadas, não apenas na relação entre agentes privados, mas na relação entre público e privado. No bojo dos processos eleitorais, fique o registro, também não seria diferente.
Portanto, passados os parágrafos introdutórios, a coluna de hoje gostaria de fazer um registro demasiado honroso, dirigindo-o a um devotado servidor da Justiça Eleitoral, acadêmico de profusão e meu amigo pessoal: falo aqui do fluminense – e torcedor do Flamengo -Bruno Andrade, autor da obra referencial “Dados Pessoais: LGPD e as eleições”, publicada pela editora D’Plácido.
A obra de Bruno, apresentada pela juíza Simone Trento e prefaciada pela advogada Vânia Aieta, ambas ilustradas Doutoras em Direito, traça um panorama muito detalhado acerca da importância de como devemos lidar com a temática da proteção de dados, aproximando-a diretamente da dinâmica dos nossos processos eleitorais.
Depois de fazer uma incursão acerca da preocupação com os dados pessoais, dos dados pessoais como um direito fundamental, muito bem acompanhado por autores europeus, norte-americanos e latino-americanos, o autor passa a lidar com a problemática das eleições. E é aí que é realizada uma valiosíssima aproximação com a realidade de outros países, como França, Reino Unido e Espanha, especialmente na relação entre dados pessoais e processos eleitorais. O autor fala também acerca da relação entre os dados pessoais e os partidos políticos. Lida, no quinto capítulo da obra, com o âmago da campanha eleitoral, em seus três momentos (pré-eleitoral, eleitoral e pós-eleição). Além de traçar considerações acerca das tensões existentes entre transparência e privacidade, para falar, depois, na Justiça Eleitoral como administradora de dados pessoais. A questão, no fim das contas, é: a JE é administradora de dados pessoais, não apenas mediadora das lides jurisdicionais eleitorais.
Por tudo, é que a coluna de hoje visa não apenas registrar e indicar a obra de excelência escrita por Bruno Andrade, mas parabeniza-lo publicamente pela iniciativa exitosa e pelo rico e oportuno conteúdo que nos entregou.

* Originalmente este conteúdo foi publicado no jornal impresso

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